Balanço de mandato
Carlos Cordeiro, o Carlão, presidiu a Contraf por três anos e está visitando federações de todo o país, ao lado de outros dirigentes da Executiva da Confederação. Eles estão preparando o Congresso da Contraf, que vai eleger a nova diretoria. No dia 28 de fevereiro ele esteve com os dirigentes da base da Federação na Plenária Pré-Congressual. Em sua fala, Carlão fez um paralelo entre a gestão de uma entidade sindical e a compra de um apartamento na planta. “Você assina o contrato e, em três anos, recebe um apartamento. Aqui é a mesma coisa, nós recebemos o voto e, três anos depois, temos que apresentar resultados das nossas ações”, comparou. Depois de sua exposição, o dirigente, que já havia concedido entrevista ao UNIDADE Informativo no início de seu mandato, voltou a conversar com nossa reportagem.
Que conquistas foram alcançadas nos últimos três anos? Que apartamento está sendo entregue aos bancários ao final desta gestão da Contraf?
O principal neste apartamento que estamos entregando, acima de tudo, é a consolidação de uma direção coesa e com olhar para todo o país. Hoje temos um número grande de diretores que visitaram todos os sindicatos. Não foi uma Contraf presidencialista, todos os sindicatos têm falado que um dos pontos fortes desta gestão é a participação dos dirigentes da Contraf em todos estados e das entidades em todos os espaços da Contraf. Seja na negociação da mesa da Fenaban, onde temos um sindicato como o do Rio de Janeiro, que é um sindicato grande, com uma participação maior, mas também sindicatos do Nordeste, do Norte do país. Houve uma ampliação da participação nas comissões de empresa e nas comissões temáticas e isto foi fundamental para alguns avanços, como o aumento real de salário, a valorização do piso da categoria, avanços na igualdade de oportunidades – como a ampliação da licença maternidade e a inclusão do parceiro homoafetivo no plano de saúde. Tivemos também avanços na segurança, por exemplo, com a obrigatoriedade dos bancos informarem semestralmente os dados sobre assaltos e ataques e, uma conquista do ano passado, a proibição do bancário transportar dinheiro. Houve avanços na saúde, com o programa de combate ao assédio moral, que prevê que os sindicatos recebam as denúncias dos bancários e encaminhem aos bancos, e que as entidades sejam informadas sobre o andamento da investigação das denúncias. Ainda na área da saúde, alcançamos outra vitória no ano passado, com o direito do bancário avaliar os exames periódicos, que são válidos como exames demissionais, e informar se foram feitos de forma adequada.
Mas o grande avanço que tivemos foi político, no ano passado. Diziam que nunca conseguiríamos aumento real porque isso contaminaria a inflação. Imagina, se os bancos não tivessem feito um acordo com aumento real, os demais setores jamais concederiam. Se com este lucro todo, o banco não der aumento real, quem é que vai dar? A grande conquista que tivemos no ano passado foi uma conquista política.
Ainda na relação com os sindicatos, tivemos também os Cadernos Contraf. A gente fala muito de igualdade de oportunidades nos bancos, mas precisamos exercitar a igualdade de oportunidades dentro dos sindicatos, das federações e da própria confederação. Começamos a fazer mais pesquisas, publicá-las nos Cadernos e cada dirigente sindical passou a receber um exemplar, etiquetado com seu nome. Esta é uma demonstração importante de que a Contraf faz pesquisas; que tem uma posição de diretoria e não mais de pessoas; e que socializa as informações e os documentos para que os dirigentes possam ter instrumentos de negociação e mobilização.
Falando em pesquisa, esta gestão inaugurou a Pesquisa do Emprego Bancário que teve muita repercussão na sociedade por desnudar a política de rotatividade e a redução dos postos de trabalho nos bancos. Aqui no Rio de Janeiro esta pesquisa motivou a campanha de mídia e de manifestações públicas contra a última onda de demissões no Itaú. Esta política de mostrar à sociedade como o sistema financeiro trata seus trabalhadores vai permanecer?
Sim, isso é fundamental. A pesquisa já era feita pelos empresários e nós passamos também a levantar estes dados. Então, começamos a olhar que a rotatividade acontece somente aqui no Brasil – nenhum outro país da América Latina ou da Europa tem a rotatividade perversa que nós temos aqui. Por isso dizemos que a rotatividade é como jaboticaba – só tem no Brasil. Isso nós descobrimos com a pesquisa. Em todos os setores da nossa economia há rotatividade, mas percebemos na pesquisa que, nos bancos, o salário médio dos novos contratados é 54 % menor que o daqueles que foram demitidos. Os bancos estão se utilizando desta rotatividade para baixar custos. Nós temos conquistado aumento real de salários, os bancos contratam, mas conseguem diminuir os custos de folha. E quando olhamos para outros setores da economia, a diferença entre os salários dos novos e dos dispensados fica em torno de 3 % . Este é um problema específico do setor bancário.
A pesquisa apontou onde está o problema. Quando nós desnudamos esta realidade, por um lado, colocamos os bancos numa situação difícil. Mas, acima de tudo, isso nos traz um desafio, que é descobrir que tipo de ação sindical – de negociação e de mobilização – temos que adotar para romper com essa violência que os bancos estão praticando. Foi depois destas pesquisas que conseguimos avanços no BB e na Caixa e foi então que conseguimos, pela primeira vez, incluir nos acordos específicos destes bancos a contratação de mais trabalhadores. Foram dez mil no BB e, em dois anos, mais dez mil na Caixa. Isso foi fruto destas pesquisas. Eu não tenho dúvidas de que, se quisermos ter emprego e remuneração de qualidade, temos que continuar investindo em pesquisas e dialogando com os dirigentes para se apropriarem destas informações e terem negociações que, de fato, possam resultar em avanços.
O que mudou na Contraf nos últimos três anos? A forma como se faz a mobilização da categoria na campanha salarial e em temas específicos? Ou as estratégias de negociação é que são diferentes?
É um conjunto de fatores. Temos, de fato, uma direção formada por pessoas que priorizaram seu tempo para serem dirigentes da Contraf. Não havia isto antes, muitos diretores apenas davam o nome para compor a direção. Hoje temos um número grande de pessoas que estão lá no dia a dia e são dirigentes qualificados, que conseguem pensar e elaborar políticas, e também negociar.
Mas isso não bastava, era preciso ter o convencimento dos sindicatos. Os filiados entenderam esta gestão e participaram muito mais. Esta gestão, junto com os sindicatos, propôs, como eu já falei, pesquisas que ajudaram nesta transformação. O resultado de uma negociação coletiva é fruto de um processo, que é feito com a qualificação dos dirigentes, a unidade nacional e o convencimento dos filiados e, acima de tudo, a mobilização maior a partir dos sindicatos, na base. Não tenho dúvida, os sindicatos, hoje, estão dialogando muito mais com os bancários, explorando os espaços na sociedade. Como aqui, no Rio de Janeiro, com a campanha contra as demissões no Itaú, onde houve veiculação de propaganda, realização de atividades, a corrida de bicicleta. Isto é positivo, porque sabemos o quanto um banco preza a sua imagem.
Nós, antes, tínhamos boas informações, mas morríamos nas negociações porque os trabalhadores sequer sabiam que estávamos negociando alguns temas. Hoje temos os sindicatos participando da negociação, os bancários informados e mobilizados e conseguimos ter uma exposição na mídia que é importante não só para termos o apoio da sociedade, mas também para expor as mazelas que os bancos praticam. Estes avanços se devem a um conjunto de fatores. Tivemos boa participação dos sindicatos, dos dirigentes da Contraf e também, muito boa, dos trabalhadores. E também uma exposição destes problemas na sociedade, conseguimos colocar os bancos numa situação difícil.
Nos últimos anos, a Contraf tem participado das negociações do BNDES e do FINEP,que são bancos públicos federais com unidades em outros estados, mas com sede no Rio de Janeiro. Tivemos a participação do Sindicato dos Securitários de MG, que é cutista, em nossas conferências. A campanha salarial dos financiários já é coordenada pela Contraf há alguns anos. Isto demonstra que a confederação está se aproximando de entidades representativas de trabalhadores de todo o sistema financeiro, não apenas bancários. Este esforço de construir a unidade dos trabalhadores do sistema financeiro é uma prioridade?
São duas questões. Primeiro, a unidade. Esta foi uma marca nos últimos três anos, o quanto ampliamos a unidade dos filiados. Antes, era comum haver calendários diferentes para negociações com a Fenaban, índices reivindicados diferentes, sindicatos que entravam e saiam da greve antes ou depois, que gerava problemas de discutir dias parados. Isto tudo enfraquecia muito o movimento. Este esforço, que foi coordenado pela Contraf, mas os sindicatos responderam de maneira positiva, foi o esforço da unidade. Dialogamos, até, com sindicatos não cutistas, alguns até que estavam fora do Comando Nacional. Eu dialoguei, inclusive, com a Contec – nos últimos dois anos, as duas confederações tiveram o mesmo índice e o mesmo calendário. Não tenho dúvidas de que os avanços que tivemos na Convenção Coletiva de Trabalho são fruto de um grau muito maior de unidade dos sindicatos – cutistas e não cutistas – porque enxergaram na Contraf esta capacidade de coordenação e articulação do processo. Isso foi fundamental na mesa de negociação, os bancos perceberam que esta unidade estava muito forte. Por isso que, na greve do ano passado, a cada dia aumentava o número de agências paradas, porque nós tínhamos o controle do processo.
A segunda questão mencionada é que queremos construir uma convenção coletiva para cada uma das categorias dentro do ramo financeiro. Hoje já temos uma só para bancários, uma só para financiários e acordo coletivo para cooperativários e também um para os trabalhadores do mercado de capitais, que são os funcionários da bolsa de valores e das corretoras. Queremos também fazer uma CCT para os securitários. Nós representamos todos estes trabalhadores, isto para nós é estratégico. Por isso vimos ampliando, ainda que a passos lentos, esta representação. Inclusive porque os trabalhadores estão enxergando neste modelo de negociação um grande espaço para valorizar suas CCTs. Este é também um reconhecimento desta nossa política acertada.
E o próximo apartamento, que está prometido para daqui a três anos? Você defende que os sindicatos precisam se especializar por temas. A Contraf vai se especializar e batalhar por um ou dois temas ou vai buscar qualificar o maior número possível de dirigentes para que vários temas sejam desenvolvidos ao mesmo tempo?
Desenvolvemos um projeto de formação em que todo dirigente sindical tinha que ter acesso a uma formação básica. Saber da estrutura e da prática sindical bancária, quais os espaços de negociação, o papel de uma federação, de uma confederação, de uma central sindical. Quem vem para o sindicalismo tem que ter uma noção geral. Mas nem todo mundo que tem afinidade pelo mesmo tema. Então, vamos continuar com este curso básico, mas vamos fazer os módulos de especialização sobre terceirização, sistema financeiro, negociação coletiva, saúde. Daqui a três anos queremos poder entregar um apartamento em que possamos ter entre 30 e 50 dirigentes especializados por tema. Como temos, por exemplo, um dirigente da base da Federação, do Sindicato do Sul Fluminense, o Miguel Pereira, que é especialista na área de terceirização e fala não só pela Contraf, mas também pela CUT Nacional. Como temos, em São Paulo, o Plínio Pavão, que é especialista na área de saúde do trabalhador. Queremos pegar este modelo e, com nossa política de formação, dar condições para que os dirigentes de todo o país possam se especializar.
Achamos que os sindicatos e federações também têm que investir nos seus projetos de formação e ter o seu tema de referência para que, na unidade nacional, tenhamos um movimento mais forte. Para que possamos transformar não só a realidade do bancário, mas a realidade da sociedade, porque pertencemos à classe dos trabalhadores. Devemos aproveitar este momento em que o Brasil é o sexto país mais rico do mundo para deixarmos de ser o décimo pior país em distribuição de renda. Qual vai ser nosso posicionamento na reforma tributária, que vai discutir o papel do Estado? Qual vai ser nosso papel na reforma política, que vai discutir o Congresso que queremos. E, acima de tudo, na reforma do sistema financeiro, para discutir que banco e que sistema financeiro temos e quais os que queremos. Por isso, é importante que os dirigentes se especializem, para que os trabalhadores enxerguem no movimento sindical e nos dirigentes sindicais as referências para uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais igualitária.
Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES