Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo realizaram conferência regional no último sábado

A 13ª Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo foi realizada no último sábado, dia 16, e definiu a delegação que vai representar a base da Federação na Conferência Nacional, que acontece no fim do mês. Os delegados da base da Federação ouviram exposições que servem de subsídio para a discussão dos quatro temas principais da Campanha Nacional de 2011:  Emprego e remuneração; saúde e condições de trabalho; igualdade de oportunidades; e sistema financeiro nacional. A Conferência teve a participação de 584 bancários, sendo 130 mulheres.


A Conferência Interestadual foi aberta pelo Quinteto de Metais composto por músicos  demitidos da Orquestra Sinfônica Brasileira e músicos em formação da OSB Jovem, que está com as atividades – e as bolsas – suspensas. O grupo executou o Hino Nacional e duas músicas do repertório erudito. Em seguida, a presidente do Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro, Deborah Cheyne – também demitida da OSB – discursou, revelando aos presentes a atual situação calamitosa por que passa o maior e mais importante grupo sinfônico do país. A crise, que é fruto dos desmandos de um maestro com tendências ditatoriais e de um Conselho Curador formado por empresários – inclusive banqueiros – revela práticas bem conhecidas dos bancários, como o corte sumário de pessoal, ignorando a experiência e os anos de dedicação dos trabalhadores.


A mesa de abertura foi composta por representantes dos dois estados e também muitos convidados que evidenciaram o caráter político do evento. Os vereadores e bancários Cláudio Damião (PT-Nova Friburgo), Cláudio Mello (PT-Teresópolis), Danilo Funke (PT-Macaé) e Reimont Otoni (PT-Rio de Janeiro), mais os vereadores Marlos Costa (PT-São Gonçalo) e Roberto Monteiro (PCdoB-RJ) representaram o parlamento municipal fluminense. O dirigente sindical Cláudio José, presidente do Sindicato dos Vigilantes de Niterói, reafirmou a necessidade dos bancários e vigilantes se unirem na luta por mais segurança e melhores condições de trabalho para as duas categorias, que trabalham ombro a ombro e estão sujeitas aos mesmos riscos. O movimento dos bombeiros do Rio de Janeiro, que ainda estão em luta por melhores salários e condições de trabalho, foi representado pelo Sargento Nascimento, integrante do comando dos trabalhadores. Nascimento ressaltou que o governador está comprometendo o bom funcionamento do estado ao tratar com desdém categorias importantes como os bombeiros, policiais, professores, enquanto oferece vantagens aos empresários.


A programação expositiva começou com uma análise de conjuntura feita pelo técnico do Dieese-RJ Cloviomar Cararine, que abordou questões relativas ao mercado de trabalho – tanto geral como o dos bancários – e demonstrou os resultados das negociações salariais do ano passado e do primeiro semestre deste ano. Uma análise da economia do país nos últimos anos e nos primeiros seis meses de 2011 também foi apresentada. Estas informações servem para embasar as discussões a respeito de um dos temas-macro da Campanha Nacional, emprego e remuneração.


O tema Saúde e condições de trabalho foi discutido em seguida, em mesa apresentada por Edilson Cerqueira, diretor da Federação, Almir Aguiar, presidente do Seeb-Rio, Ricardo Lontra, diretor de saúde do Sindicato dos Bancários de Nova Friburgo, e Adilma Nunes, diretora do Seeb-Rio e psicóloga. Os expositores ressaltaram que o tradicional adoecimento dos bancários por LER/DORT tem sido superado pelo aumento cada vez maior da ocorrência de transtornos mentais, com uso também crescente de medicamentos “tarja preta” pela categoria, em razão do desgaste emocional causado pela pressão pelo cumprimento de metas e o assédio moral nos locais de trabalho. Também foi ressaltado o péssimo tratamento dispensado pelos peritos do INSS aos trabalhadores adoecidos, o que acaba agravando o estado de saúde dos segurados e, muitas vezes, retardando e até impedindo a recuperação. Edilson Cerqueira ressaltou que o movimento sindical de todas as categorias está se mobilizando e contactando parlamentares, o Ministério do Trabalho e até o Judiciário para exigir a correção da conduta dos peritos da previdência social.


A mesa seguinte foi relativa ao tema Sistema Financeiro Nacional, com discussões sobre as recentes resoluções do Banco Central a respeito dos correspondentes bancários. O BaCen vem atuando como legislador ao determinar o funcionamento do SFN. A mesa foi composta pelo secretário de organização da Contraf-CUT, Miguel Pereira, pela assessora jurídica da Federação, Sayonara Grillo, e pelo diretor da Federação Paulo Garcez. Este último destacou de maneira enfática o risco que a categoria bancária corre com a publicação das últimas decisões: “Estas resoluções podem ser mais desastrosas para os bancários do que foi a informatização nos anos 90”, avaliou o sindicalista.


A mesa seguinte foi sobre o tema Igualdade de Oportunidades, apresentada por Iraciny da Veiga, diretora para Questões da Mulher da Federação, e Almir Aguiar, presidente do Sindicato do Rio de Janeiro. Foi apresentado o Caderno de Igualdade de Oportunidades, lançado pela Contraf. Iraciny e Almir também falaram do histórico das discussões sobre o assunto – sempre puxado pelos bancários – e da resistência dos banqueiros a negociar e avançar no tema.


Em seguida o diretor para Bancos Privados da Federação, Euclides Netto, fez uma apresentação sobre mudanças climáticas e leu o Manifesto em Defesa do Meio Ambiente, aprovado pelo plenário. A diretora do Seeb-Rio Vera Luiza Xavier leu uma carta endereçada a Roberto Setúbal, presidente do Itaú/Unibanco, com críticas severas à estratégia do grupo de demitir funcionários para gerar mais lucro para os acionistas. A proposta de Vera, de que todos os sindicatos filiados e a Federação assinassem a carta, foi aprovada pelo plenário. Em seguida, os presentes à 13ª Conferência Interestadual aprovaram uma moção de apoio aos músicos demitidos da Orquestra Sinfônica Brasileira.


O último ponto de pauta foi o debate sobre estratégia e propostas para a Campanha Salarial. Representantes das forças políticas que atuam na base da Federação apresentaram suas ponderações. A aclamação da chapa única de delegados aconteceu em seguida, encerrando o evento.


A 13ª Conferência Interestadual foi transmitida ao vivo pela Internet, numa parceria entre a Federação e os sindicatos do Rio de Janeiro e Niterói, nos sites e nos perfis das entidades no Facebook e no Twitter. Os vídeos estão disponíveis nos canais da Federação (http://www.ustream.tv/channel/feeb-rj-es) e do Seeb-Rio (http://www.ustream.tv/channel/bancario). 


Leia aqui o texto do Manifesto em Defesa do Meio Ambiente
Leia aqui o texto da carta a Roberto Setúbal, presidente do Itaú/Unibanco

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

Manifesto em Defesa do Meio Ambiente

Niterói, 16 de julho de 2011



Em 2010, A Federação dos  Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo e a Central Única dos Trabalhadores (CUT-RJ) assinaram o “protocolo de Intenções”, documento este em que as entidades se comprometem a neutralizar suas emissões de carbono. Em conformidade com o documento assinado a Federação já vem tomando algumas medidas no sentido de reduzir suas de CO2, provocadas pelas atividades do dia a dia. A proposta do manifesto em defesa do Meio Ambiente é de conclamar e chamar a atenção da categoria bancária para a importância da preservação ambiental.


Por conta da  realização da 13º Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo, a Federação está oferecendo mudas de árvores nativas da Mata Atlântica, entre elas o ipê amarelo e o pau-brasil,  entre outras, como forma de iniciar nossa luta contra o aquecimento global. Por dialogar diariamente com todas as classes sociais, a categoria bancária tem importância fundamental na construção coletiva de uma sociedade mais justa e sustentável. Lutar pela sustentabilidade do Planeta é um dever de todos nós para que a nossa e as futuras gerações tenham qualidade de vida.










“Se descesse um enviado dos céus e me garantisse que minha morte iria fortalecer nossa luta, até que valeria a pena.
Mas a experiência nos ensina o contrário. Então eu quero viver. Ato público e enterro numeroso não salvarão a Amazônia. Quero viver.”
Chico Mendes

13ª Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo


 

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

Carta a Roberto Setúbal, presidente do Itaú/Unibanco

A seguinte carta foi elaborada pelo Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro e será enviada ao presidente do grupo Itaú/Unibanco. O envio da carta foi aprovado pela plenária da 13ª Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo, realizada no último sábado, dia 16, em Niterói.


 


Exmo. Sr.


 


A “lição de casa” que Vossa Senhoria prometeu aos acionistas do Itaú Unibanco, ou seja, os cortes de custos concentrados na redução do quadro de pessoal é a mais viva expressão do saudosismo que a elite brasileira nutre pela escravidão.


 


A prática cultural da mentira e da desfaçatez faz de pessoas como Vossa Senhoria os personagens mais presunçosos dessa elite. Nas demissões de hoje, o triste bordão do passado: “Empregado precisa de salário para quê?”


 


Seus porta-vozes alegam que estão revendo negócios, processos e gastos, para buscar mais eficiência, mas que não querem demitir. Dizem também que vão criar novas vagas. Vê-se que aqui, sim, os executivos estão fazendo a “lição de casa” – também mentir. As demissões seguem um curso quase torrencial, todos os dias, em todas as praças.


 


A fusão Itaú Unibanco pressupõe uma estratégia de expansão. Também nesse caso é preciso levar em conta a importância do binômio emprego e renda, uma lição que o presidente Lula ensinou ao mundo na crise financeira de 2008. A lógica de tratar os trabalhadores como “laranjas”, peças descartáveis, só é possível porque o Congresso Nacional ainda não votou a nova adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que inibe as demissões imotivadas, injustificáveis, especialmente considerando a lucratividade do Itaú Unibanco – R$3,35 bilhões no primeiro trimestre deste ano; e R$13,3 bilhões, ao longo de 2010.


 


Queremos expressar toda a nossa repulsa à iniciativa demissionária de Vossa Senhoria e exigir respeito aos trabalhadores, que constroem a riqueza do império dos Setúbal/Salles. Sua política de recursos humanos, cruel e destruidora, contradiz por completo os princípios de sustentabilidade, em que se baseou o prêmio recentemente auferido pelo Itaú Unibanco.


 


Demitir, tornando mais agudos os problemas administrativos que o banco enfrenta depois da fusão, é, sobretudo, um desrespeito à clientela, demonstrando despreocupação da empresa em relação à qualidade dos serviços que oferece.


Quanto aos bancários, além de conviverem há tempos com a pressão por metas absurdas, convivem, agora, com a imagem tenebrosa do desemprego criada pelo presidente da empresa.


 


Mas saiba Vossa Senhoria que os trabalhadores do Itaú Unibanco darão uma resposta à altura.


 


A diretoria

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

Olívio Dutra: ” A importância do PT está em não se acomodar “

 




Bigode, a marca registrada do ex-governador gaúcho l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Nubia Silveira


A fala mansa, o bigode farto, o vocabulário marcado por termos típicos do gaúcho do interior, a serenidade ao expor os pontos de vista fazem de Olívio Dutra o tipo inesquecível de qualquer um que já tenha convivido com ele, nem que seja por apenas alguns instantes. Líder estudantil, sindical e político, o ex-governador gaúcho (1º de janeiro de 1999 a 31 de dezembro de 2002) se diz, antes de tudo, um bancário. Fez concurso para contínuo e depois para escriturário no Banco do Estado do Rio Grande do Sul – Banrisul, onde trabalhou até se aposentar. Há 41 anos trocou a cidade de São Luiz Gonzaga, onde estudou e começou a trabalhar, e o distrito de Bossoroca, onde nasceu, por Porto Alegre. Uma troca forçada pelas autoridades, depois de um desentendimento com o prefeito. Desde aquela época vive no mesmo apartamento de dois quartos, na Zona Norte de Porto Alegre, que comprou de um colega bancário.


Olívio presidiu a União São Luizense de Estudentes e o Sindicato de Bancários de Porto Alegre. Foi prefeito da capital gaúcha, governador de Estado, deputado constituinte e ministro do governo Lula. Nenhum cargo conseguiu mudar seus hábitos. Anda de ônibus pela cidade, atende o celular, sempre bem-disposto, e, aos domingos, quando não chove e está em Porto Alegre, pedala por mais de duas horas, no percurso Zona Norte-Centro-Bom Fim- Zona Norte. Apesar dos boatos, diz que não vai se candidatar ao Senado. Está comprometido com os movimentos sociais. Viaja pelo interior do Estado, segundo ele, não para fazer campanha, mas para falar sobre “a construção partidária”.



Olívio continua a andar pela cidade de ônibus l Foto: Dhiego Correa/twitpic


Nunca participou de qualquer partido político, antes de ajudar a fundar o PT. Mas, reconhece que tinha simpatias pelo Partidão, ao qual pertencia um tio, irmão de sua mãe. Para Olívio, a importância do PT está em “não se acomodar, não passar de um partido de transformação a um partido da acomodação”. É pelo que ele vem lutando há 30 anos.


Com seu jeito simples e gestos que fortalecem as falas, não se nega a fazer críticas. Elogia os governos do petista e amigo Luiz Inácio Lula da Silva, com quem dividiu o apartamento no tempo da Constituinte, mas reconhece: “a estrutura fundamental do Estado brasileiro não foi mexida”. Outro ponto em que, afirma, o país pouco evoluiu foi na questão da reforma agrária. “Nós, na Constituinte, não conseguimos retirar do texto da Constituição uma espécie de aura sagrada da propriedade”, lembra.


Antes de comemorar os 70 anos, com uma grande festa, realizada no dia 11 de junho, ele deu uma longa entrevista (duas horas e meia de conversa) ao Sul21, da qual participaram os repórteres da casa – Milton Ribeiro, Rachel Duarte e Igor Natusch – e os convidados Antônio Oliveira e Poti Silveira Campos.


Milton — O senhor se formou em Letras. Por quê? Depois, virou bancário. Vamos começar com as Letras.
Olívio Dutra –
Não, eu fui bancário antes de qualquer coisa.



“Fui bancário antes de qualquer coisa” l Ramiro Furquim/Sul21


Milton — Antes?
Olívio —
Claro. Fui bancário por 35 anos, funcionário concursado do Banco do Estado do Rio Grande. E, aliás, entrei por concurso na função de contínuo do Banco, lá em São Luiz Gonzaga. Só depois de três anos, com concurso interno, feito em Santa Maria, junto com outros, passei a ser escriturário. Então, vim me formar em Letras — licenciatura de Língua Portuguesa e Inglesa, Língua e Literatura — aqui na UFRGS, em 1975. Então, fui mais um trabalhador que estudava do que um estudante que trabalhava. A prioridade era o meu trabalho, o meu emprego, né. Porque cheguei aqui com a Judite grávida da Laura e nós tínhamos o Espártaco com um ano de idade.


Milton — Espártaco.
Olívio –
É. O Espártaco, meu filho, com um ano de idade. E a Judite grávida da Laura. Eu (era) bancário, com nove anos já de profissão bancária, funcionário do Banco, quando cheguei aqui, em 1970, em Porto Alegre. Então…


“Não nasci na vila da Bossoroca. Nasci no fundão da Bossoroca”


Milton — Então o senhor…
Olívio –
Mas deixa eu ver como é que eu respondo, como é a questão, porque eu sou formado em ciências ocultas e letras apagadas…
(risos)
Olívio —
Tem um pouquinho de história mais antiga: o meu pai era um carpinteiro lá em São Luiz Gonzaga quando eu nasci. Nasci em Bossoroca, em 1941. Naquela época, Bossoroca era terceiro distrito de São Luiz Gonzaga. E eu não nasci na vila da Bossoroca, eu nasci no fundão da Bossoroca, onde meus familiares eram agregados no fundo dos campos dos fazendeiros lá no rincão chamado Rincão Feio. Nesse local é que eu nasci, já o segundo filho de uma família de sem terras agregados no fundo de campo. Minha mãe na lida de casa. Nunca foi trabalhar na fazenda. Agora, os irmãos da minha mãe eram peões de fazenda. O meu pai era aramador, ou alambrador, como queira. Para nós, era aramador. Era aquele trabalhador que fazia as cercas, estendia os arames, fazia todas aquelas amarrações. Claro, é no mato. Também ajudava a escolher as árvores, fazia o corte adequado, conhecia madeira e árvores como a unha.



Bossoroca, terra natal de Olívio: “Naquela época, Bossoroca era terceiro distrito de São Luiz Gonzaga” l Foto: estacoesferroviarias.com_.br


Rachel – (servindo vinho) Não entendo muito (de vinho), mas é o que a casa oferece. O que a gente serve para começar?
Olívio –
A gente começa com o menos nobre pra deixar o melhor pro fim, mas acho que ambos são bons.


Igor — Vamos de branco? Não, vamos de tinto, né?
Olívio —
É, vinho tinto. Mas, a gente pode começar com o branco, né.


Rachel — Então vamos.
Olívio –
Depois nós concluímos com o tinto. Mas vejam que o meu pai, além de alambrador, era também um artífice. Era um pequeno artesão. As origens dele eram missioneiras. Era uma mistura de negro com índio, cafuzo. E a família da minha mãe era um pouco mais… Tinha também bugre, mas tinha português e castelhano. Meu avô era Saulistiano do Amaral Beis, meu avô materno. O meu pai foi se desdobrando ao casar, naquele mundo lá. Ele viu que chegou o primeiro filho, chegou o segundo filho. Não dava pra ele viver daquela profissão. Até porque as fazendas estavam também delimitadas. Fazer móveis rústicos para a casa dos fazendeiros — o que ele também fazia — não dava o suficiente. Ele fazia galpões, fazia as mangueiras, fazia os móveis pra dentro de casa também. Então, ele se tocou pra cidade mais próxima: São Luiz Gonzaga. E eu (era) um guri chorão de colo, nos cueros. Ele atou uma vaquinha, que não vendera, atrás de uma carreta. E passaram-se quinze dias (para ir) do local onde eu nasci até chegar em São Luiz Gonzaga. Ele já tinha ido antes a cavalo pra ver onde é que ia se instalar. Comprou um terreninho na periferia de São Luiz. Não tinha luz, não tinha água; tinha que fazer poço e tal. Então foi lá, em São Luiz Gonzaga, que ele criou a família dele: cinco filhos, eu sou o segundo, três homens e duas mulheres. E na profissão dele, carpinteiro. Então, aí ele fazia pequenos serviços de reparação nas casas. Tinha uma caixinha de ferramentas. Foi indo e ele passou a ser um pequeno empreiteiro. Ele tinha a oportunidade de fazer uma casa inteira de madeira. A pessoa que faz uma casa de madeira numa cidade pequena não é ainda das elites. Ele foi sendo referência do trabalho em madeira, e foi também sendo contratado pra fazer as casas, o interior das casas de alvenaria. Contratavam ele pra fazer escadarias como esta, o forro, o assoalho, as janelas, as portas. Então passou a ter uma pequena oficininha em casa. Até hoje tem o banco de carpinteiro dele lá em São Luiz Gonzaga. E quando chega a época de irmos para a escola — entrei no colégio com seis anos, meu irmão tinha sete — não podia ficar em casa, tinha que ir pra escola. Fomos os dois pra escola: o Grupo Escolar Senador Pinheiro, lá em São Luiz Gonzaga. Me formei lá. Eram cinco séries. Depois, não tinha mais que isso. Meu pai não tinha condições de pagar outra escola fora de São Luiz. Os filhos das famílias abastadas ou de classe média podiam ir pra Santo Ângelo, Santa Maria…



“Os filhos das famílias abastadas ou de classe média podiam ir pra Santo Ângelo, Santa Maria…” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Milton — Porto Alegre
Olívio –
…Porto Alegre, Passo Fundo. Estancou ali. Tinha o Ginásio Santo Antônio. Esse ginásio era administrado por uma ordem religiosa católica de padres americanos. Eles eram franciscanos menores, conventuais americanos. Aliás, era uma raridade, porque eles só tinham duas missões aqui no Brasil. Uma era lá no Centro-Oeste e outra aqui no Sul, no Rio Grande, nas Missões lá em São Luiz. É um colégio confessional, de uma ordem religiosa, (de) freis católicos menores, conventuais norte-americanos. O que é uma raridade. Entre os americanos, a religião predominante é a protestante; eles eram de uma ordem católica. Alguns deles, hoje lembro bem, eram pessoas de uma formação cultural forte, séria, de (conhecer) grego, latim, línguas, claro, a língua deles inglês, mas chegavam falando português, espanhol, francês. Mas depois, mais adiante, começou a vir padres que eram mais… Parece que tentando se ajeitar na vida, porque tinham sido capelães nas guerras na Indochina e em outros lugares do mundo. E eles estavam lá em São Luiz, dois ou três deles. O padre Kanut, me lembro bem, (era um) sujeito atarracado. A gurizada, quando sabia que eles chegavam lá sem saber falar uma palavra de português, ficava em roda dizendo nome feio, chamando disso e daquilo, até que, claro, aquele padre começou a ver, a desconfiar que ele… E a formação dele não era de educador. Certamente era de uma figura que estava com problemas de existência na questão de pra onde fora como capelão militar naquelas pontas que os Estados Unidos estavam mandando gente pra alguma guerra localizada longe. E então ele reagia com uma violência assim. Quando começava a compreender o português e sabia que a gurizada estava dizendo nome feio pra ele, ele pegava a gurizada, dava uma gravata e enchia de cascudos. Lembro bem de uma ocasião em que um guri mais esperto disse nome feio e já ficou preparado pra correr. Esse guri correu o pátio, o colégio, pulou o muro do colégio para a rua, passou para a praça principal de São Luiz Gonzaga e o padre Kanut atrás dele. O padre não parou enquanto não o pegou, longe do colégio. E a população ficava olhando. Sei que deu uns cascudos no guri, (que estava) cansado. Mas ele não cansou, era atleta, e o…


“Diziam que o filho do carpinteiro era interessado, dedicado. Eu realmente aproveitei a ocasião”


Poti — O senhor nunca entrou no cascudo?
Olívio —
Não, nunca entrei no cascudo. Eu sei que esse menino era filho de um militar, porque lá tinha… Isso era antes do golpe. O golpe foi em 1964 e isso aconteceu na década de 50. Então havia militares (em São Luiz Gonzaga). Esse menino era filho de um oficial do Exército. Eu sei que houve problemas lá com os padres, mas a comunidade da cidade, que amparava os padres, as senhoras da alta sociedade, os dirigentes do poder, apaziguaram as coisas.


Mas o meu pai não podia pagar o colégio, que era particular. Mas aí ele trabalhava com os padres na oficina dos padres, que precisavam fazer coisas de carpintaria. Então meu pai pagava a escola, o colégio, o ginásio, pro meu irmão e pra mim, com o trabalho dele. E nós ficamos – eu, particularmente — semi-interno, ajudando a varrer, a cuidar das coisas. Nos finais de semana ia pra casa. Isso era na cidade. E nós morávamos longe, lá na periferia. Então isso me oportunizou a acessar livros, e a aprender inglês. Eles diziam que o filho do carpinteiro era interessado, dedicado e aquela coisa toda, e eu realmente aproveitei a ocasião. Me lembro bem da biblioteca variada. Imagina no ginásio tu leres Machado de Assis. Eles eram americanos. Nos nossos colégios, colégios das freiras na cidade, não se lia Machado de Assis. Tinha que ler os livrinhos religiosos, catecismo, aquela coisa toda. No ginásio, além dos livros religiosos, do catecismo, tive acesso a uma biblioteca e tive acesso a livros em inglês, e tive a oportunidade de ter aulas de inglês fora do horário da aula. Então, a prática me deixou com uma fluência em inglês.


Rachel — Mas o senhor ainda está estudando, né?
Olívio –
Isso me deixou fluente…



“Entrei numa luta junto com outros jovens pra trazer pra São Luiz uma escola da Campanha Nacional de Educandários Gratuitos” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Rachel — Pra treinar?
Olívio –
…pra aquela época. Há 50 anos, eu tinha 14, 15, 16 anos. Então, estou dizendo isso porque depois eu vim fazer Línguas, Literatura, Inglês e Português, porque tem esse passado lá. Mas eu andei estudando também Direito, essas coisas todas. Não concluí porque não tinha em São Luiz Gonzaga, não tinha nem escola de segundo grau, né. Tinha o ginásio e pra onde tu ia depois do ginásio? Depois, mais tarde, ia ter uma escola técnica de comércio, em que eu me formei, já sendo bancário. Depois entrei numa luta junto com outros jovens pra trazer pra São Luiz uma escola da Campanha Nacional de Educandários Gratuitos, a CNEG, hoje é CNEC — Campanha Nacional dos Educandários da Comunidade. Eu me lembro bem. Isso era um movimento na base da Igreja Católica. Começou lá no Norte, no Amazonas, era Tiago Gomes o líder desse movimento que se espalhou pelo país (A Campanha nasceu em 1943, em Recife, idealizada por um grupo de universitários, liderados por Felipe Tiago Gomes. Surgiu com o nome de Campanha do Ginasiano Pobre. Depois, passou a ser chamada de Campanha dos Educandários Gratuitos e Campanha Nacional de Educandários Gratuitos. Atualmente, chama-se Campanha Nacional de Escolas da Comunidade – CNEC). E lá em São Luiz a gente estava na periferia desse movimento, mas conseguimos. Isso é em 1964. Aí é que deu o problema comigo que ocasionou minha transferência pra Porto Alegre. Então eu casei em 1968, 1969. Entrei no Banco em 1961.



Tiago Gomes liderou a Campanha Nacional de Educandários Gratuitos l Foto: cnecbarroso.blogspot


Milton — 1961. Vinte anos.
Olívio –
É, e não tinha feito o terceiro grau. Tinha feito o primário e o ginásio. Fiz a Escola Técnica de Comércio. Comecei a frequentar umas aulas lá na Fidene (Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado), a Fundação que vem a ser hoje a Faculdade de Filosofia lá de Ijuí, e que depois tem uma extensão lá em Santo Ângelo (a Fidene, hoje, é a mantenedora da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí, do Centro de Educação Básica Francisco de Assis — EFA, do Museu Antropológico Diretor Pestana – MADP e da Rádio e Televisão Educativa — RTVE). Aí eu estudava. Pegava um ônibus pra ir nessa cidade estudar depois do expediente.


Milton — O senhor trabalhava, o senhor estudava e, em 1975, o senhor se formou e se tornou presidente do Sindicato dos Bancários.
Olívio –
Exatamente.


Milton — Ao mesmo tempo?
Olívio –
Exatamente.


Milton — Como é que se consegue se formar e se tornar presidente do sindicato?
Olívio –
Mas eu me formei antes de ser presidente.


“Pra começar a greve teve uma reunião, pra terminar não houve nenhuma consulta. Isso ficou martelando na minha cabeça”


Milton — Mas foi no mesmo ano.
Olívio –
Claro. Eu militava na base do sindicato. Quer dizer, a primeira coisa que eu fiz, quando cheguei em Porto Alegre, foi me filiar ao sindicato. Eu tinha participado de uma greve, a primeira greve da minha vida, em 1962, lá em São Luiz Gonzaga, um ano depois de ser bancário. Estourou uma greve na nossa categoria no Estado, antes do golpe, em 1962. O sindicato mais próximo era o de Santo Ângelo. O presidente da Federação dos Bancários, naquela época, era o Paulo Eduardo Steinhause, que era de Santo Ângelo. Um grupo, num final de tarde, lá em Santo Ângelo, foi lá pra São Luiz. Mas, primeiro deram umas telefonadas. Pra quem? Pra mim, porque já tinha uma referência e tal. Era uma referência ali até porque minha tarefa como contínuo do Banco era fazer serviço pra fora, entregar aviso de vencimento de duplicata, ir no correio, ir na telefônica, e a telefônica era só na prefeitura, era passar telex, então tinha que ir lá. Isso era o trabalho do contínuo. Então isso fazia eu chegar em todas agências de banco que tinha na época. Tinha poucos bancos: Banco da Província, Banco do Comércio, não tinha ainda o Banco do Brasil, e o Banrisul. Na verdade, eram três agências de banco. Tinha a Caixa Econômica Estadual. Caixa Econômica? Não. Não tinha. Então tocou pra mim dizer pro pessoal e ir convocá-los pra uma reunião depois do expediente, e onde? Na Casa Rural, que é a casa dos fazendeiros. Na Casa Rural de São Luiz Gonzaga. Nos cederam um espaço numa sala lá, para nos reunirmos. Nos reunimos, veio o pessoal do sindicato de Santo Ângelo, a Federação, colocaram as razões da greve, as negociações se desalinhavam e precisaríamos mostrar força pra arrancar alguma proposta dos banqueiros. Então estavam dadas as razões. Teve perguntas nossas pro pessoal. O pessoal decidiu pela greve. Bom, dois dias depois terminou a greve. Mas aí eu fiquei me perguntando: “bom, pra começar a greve teve uma reunião, pra terminar a greve não houve nenhuma consulta?”. Ficou me martelando aquela pergunta. Mas (fazê-la) pra quem? Não tinha sindicato (em São Luiz Gonzaga). O pessoal não voltou lá e tal. E tinha muito bancário lá, que na verdade eram de outras cidades. Naquele tempo bancário tinha certo status.



Na greve de 1962, categoria não estava comprometida com o movimento l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Rachel — Claro.
Olívio –
Faziam o concurso e eram destacados pra lá. Eles vinham de outras cidades e, na primeira oportunidade que tinham, eles voltavam pras suas cidades, pra visitar os familiares, namorar e tal. Então, estourou aquela greve e, sem muita consciência de coisa nenhuma, o pessoal disse: “então vou aproveitar e vou em casa; vou a Uruguaiana; vou visitar minha família, e tu fica acompanhando aí e qualquer coisa tu me avisa”.
(risos)
Olívio – Mas avisar como? “Vai ali naquele programa gauchesco que tem ali na rádio São Luiz e tal”. E uns de São Luiz pegaram uns engradados de Brahma e foram para a costa do (Rio) Piratini. E bueno, e pum! Termina aquela greve e eu fiquei com aquela tarefa de avisar todo mundo. Fui lá no programa da rádio pra dar a notícia que a greve tinha terminado e tal. Eu sei que houve bancário que chegou um dia depois, né.
(risos)
Olívio —
Imagina, isso era uma greve antes do golpe de 1964. Bueno, então me ficou martelando na cabeça assim: “mas como é que é esse negócio?”. Bom, 1962. Mas, nesse processo, vem essa luta pela escola da comunidade. Eu e um grupo de jovens achamos que não era possível ficar numa cidade sem uma escola de segundo grau lá. Tinha a União São Luizense de Estudantes. Aliás, também é importante dizer: eu fui presidente dessa União São Luizense de Estudantes.


Igor — Que ano?
Olívio –
Eu era solteiro ainda, claro, isso foi em 1958. Por aí.


Milton — Tinha dezessete anos.
Olívio –
É, por aí. Foi uma chapa que fizemos pela oposição. O que era a USLE, União São Luizense de Estudantes? Era uma entidade recreativa né, em que a juventude estudantil lá da cidade ia. Os que estavam na direção da USLE eram aqueles que iam estudar fora. Estavam estudando em Santo Ângelo, Cruz Alta, Santa Maria, até mesmo em Porto Alegre. Então a USLE funcionava nas férias, quando eles vinham pra fazer um baile; o baile da rainha dos estudantes e outras coisas.



“Nós fizemos umas mudanças na atuação da USLE” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Rachel — Por isso que ele observou que era solteiro na época: “rainha dos estudantes”.
(risos)
Olívio –
E aí nós da cidade, os filhos da família de renda mais modesta, fizemos uma chapa de oposição, e eu fui eleito presidente da USLE. Nós fizemos umas mudanças na atuação da entidade pra ela discutir essas coisas. Mas isso estava dando muito trabalho. Eu tinha que trabalhar; não tinha que estar naquela militância. Eu sei que estive um ano e pouco ali. Acho que antes mesmo de terminar meu período de mandato eu saí. Ficou o vice lá. Eu tinha que estar no batente. Entramos naquela luta da instalação dessa escola. Mas tinha toda uma tramitação. Primeiro que era um movimento da base da Igreja Católica, de cristãos e jovens. E nós éramos uma ala mais, digamos, por ser jovens, justamente, mais rebeldes, e tinha o grupo dos mais velhos naquelas reuniões da base da Igreja, principalmente dos Vicentinos, que é uma congregação dentro da Igreja Católica, da qual a gente participou formalmente. Bom, nessa movimentação toda, nós conseguimos organizar papéis e tudo para essa escola, e quem sabia um pouquinho mais era professor. Eu sabia Inglês, assim como havia outros que sabiam Matemática, Geografia e tal. Tínhamos que nos submeter às exigências que tinham na época. A Fidene em Ijuí nos preparou cursinhos de Pedagogia, de Didática, essas coisas todas, porque era fundamental para que uma escola se instalasse. E aí o golpe já tinha se dado, e qualquer movimento ou coisa integrada já era suspeição de que tinha agito, agitadores e que era subversão e nós, no nosso movimento, nos propúnhamos (ter) eleição direta da direção da escola. O prefeito, por sinal primo do Jango, mas era do antigo PSD, portanto aquele que deu origem à Arena claro. E era cunhado do Gustavo Langsch, que tinha sido presidente da Assembleia Legislativa (de 21 de abil 1962 a 31 de janeiro de 1963) , tinha sido deputado estadual, tinha sido presidente do Banco do Estado, na ocasião era presidente do Banco do Estado do Rio Grande e eu era funcionário do Banco. E o prefeito era cunhado do presidente.


“O prefeito puxou o revólver para mim”


Milton — Só eles.
Olívio –
E o prefeito se indispôs comigo por conta que eu era o que mais insistia, e inclusive escrevia no jornalzinho “A Notícia” lá o porquê da eleição direta da direção da escola. E hoje eu lembro as coisas…
(risos)
Olívio —
O prefeito chegou a puxar o revólver pra mim.


Rachel — Não.
Olívio –
Claro. Fui no Banco trabalhar de manhã. A gente trabalhava sábado inclusive, sábado de manhã. E esse episódio foi um negócio; pra mim, foi um demarcador de situação de vida né, porque aquilo, primeiro, ou me levavam para o quartel para ver se eu estava agindo ao contrário do establishment.



“Caso não aceitasse a transferência, seria demitido” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Poti — Que ano isso?
Olívio —
Isso já em 1968, acho que já era depois do AI-5.


Poti — Golpe do golpe.
Olívio –
É.

Antônio Oliveira — Como era o nome do prefeito, tu lembra?
Olívio –
É João Belchior Marques Goulart. É nome de escola (este é o nome do ex-presidente João Goulart, o Jango. O prefeito chamava-se João Belchior Goulart Loureiro e dá nome a um ginásio de esportes).


Igor — E por que do revólver?
Olívio –
Porque ele achou que o que eu escrevi no jornal era…


Milton — Libertário.
Olívio –
Um desaforo, né


Milton — Subversivo.
Olívio —
É, e foi dentro do Banco. (Eu disse:)“Mas se o senhor tem assunto pra conversar comigo nesse teor, então temos que conversar ali fora, na frente do Banco”. (Ele disse:) “Não, mas o senhor me acompanhe”. Eu digo: “acompanho mas…”. E o carro dele estava ali; tinha motorista e tal. E eu fui (no carro do prefeito) para a direção do quartel. Eu digo: “a troco de que o senhor está me levando nessa direção? Não tem nenhuma autoridade e não vou me submeter a isso daqui.” Pedi pro cara parar o carro para descer. Desci por um lado; ele desceu pelo outro com o revólver na mão. Aí me lembro que teve gente lá que viu aquele negócio. Ele se foi e eu voltei a pé pro Banco.
(risos)
Olívio –
Mas no dia seguinte, naquele mesmo dia, já estava lá uma transferência, e caso não aceitasse a transferência, uma demissão. Só não me demitiram porque eu não tinha entrado nessa conversa do FGTS, te lembra? O FGTS foi criado para acabar com a estabilidade, e eu não tinha optado. Só fui optar muito mais tarde (O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS foi criado pela Lei 5.107, de 13 de setembro de 1966). Mas aí, então é isso. Venho pra Porto Alegre, porque se eu ficasse tinha uma indisposição com os poderosos.



“Já faz 41 anos que eu estou aqui em Porto Alegre, e moro no mesmo lugar, no mesmo prédio, no mesmo apartamento” l Foto: Denison Fagundes / Carta Capital


Igor — O clima não era nada bom.
Olívio –
Uma indisposição com os caras do poder local. Então conversamos com o povo nosso, os estudantes (e dissemos): “é isso aí”. E aí que chegamos em Porto Alegre, em maio de 1970. Já faz 41 anos que eu estou aqui em Porto Alegre, e moro no mesmo lugar, no mesmo prédio, no mesmo apartamento ali na Assis Brasil 280, apartamento 420. Criei dois filhos ali, um casal de filhos num apartamento de dois quartos.


Milton — Mas o senhor casou quando?
Olívio –
Eu casei lá em São Luiz Gonzaga.


Antônio Oliveira — Já estava casado.
Olívio –
Claro.


“A Judite é um amor antigo. Ela é filha de agricultores de origem alemã”


Poti — Quando desse episódio com o prefeito o senhor já estava casado?
Olívio —
Claro, nesse episódio que eu falei já estava casado. O Espártaco nasceu lá em São Luiz, a Laura não, ela nasceu aqui. E a Judite é um amor antigo.


Rachel — Mas na época da União dos Estudantes ela não existia. Quando é que surgiu?
Olívio –
Não, ela existia. Esse colégio, o Ginásio Santo Antônio de Pádua, era a uma quadra da Praça Central, a duas quadras da Igreja. A Judite, que é filha de agricultores de origem alemã, veio do interior do Rolador, hoje um município autônomo. Mais precisamente da localidade chamada Passo da Quaresma, que fica na barranca do rio Ijuí. O pai dela, seu Alfredo, era proprietário com 11 filhos, numa área de 42 hectares. Uma área de terras dobradas, difícil de trabalhar. Mas ele plantava pra subsistência. Me lembro bem que plantava alfafa. Naquele tempo o quartel era cavalaria, então os agricultores daquela região ganhavam bem, sabendo que tinham pra quem vender, produzindo alfafa. O que hoje é soja, naquela época era alfafa. Tinha alfafa, milho e, claro, aquelas coisas de subsistência. Criava porquinhos, galinha, vaca de leite. Então era uma pequena família de 11 filhos numa terra de 42 hectares, grande parte de área dobrada nas barrancas do rio Ijuí. E a Judite tinha uma irmã mais velha que já estava trabalhando na cidade, numa casa de gente rica da cidade, que era na frente do ginásio Antônio de Pádua. E ela foi então com a irmã dela, que já estava nessa casa e trabalhava meio de gerente de uma loja de confecções. Hoje não existe mais. Então, ela levou a Judite lá pra Judite trabalhar nessa casa também e estudar no colégio de freiras salesianas, duas quadras dali. E foi ali que eu conheci a Judite, porque eu era semi-interno naquele colégio ali, na frente. No outro lado da rua era a casa dessa família onde ela trabalhava e aparecia num balcão. Não sei como chama, numa sacada, e eu lá embaixo…



Judite: um amor de 50 anos l Foto: flor-em-poemas.blogspot.com


Rachel — De olho.
Olívio –
É, de olho no outro lado da rua, no jardim dos padres. E é isso, e ia na missa, a primeira missa… É aí que nos conhecemos. Mas isso durou oito anos. Namoramos oito anos. Depois um ano de noivado e casamos. Então é isso, casamos depois de nove anos de sequência. Naquele tempo também a gente não se via todo dia, às vezes nem toda semana, passava duas, três…


Poti – Namorava no sofá lá na casa do seu sogro.
Olívio –
Não, (ele) morava pra fora; não tinha como ir lá. Tinha que ir de ônibus. Depois, quando já estava no Banco, comprei uma lambretinha. Fiz um empréstimo, um financiamento e comprei uma Lambreta, pra vim lá de casa no Banco. Mas não tinha calçamento; quando chovia, não podia. A Lambreta não anda no barro.



Olívio – Outras ocasiões, quando ia lá (na casa da Judite) e caia uma chuva, digamos sábado, eu posava lá e, no domingo, tinha que voltar porque segunda tinha que estar no batente. Bah! Teve ocasiões que chovia e formou barro e lodo e os rios saiam da caixa. E como é que eu ia sair de lá? Aí os meus cunhados (diziam:) “nós vamos sair bem cedo de madrugada de carroça”. E eu colocava a Lambreta numa carroça puxada a boi e ia lá de onde eles moravam, nos fundões da barranca do Ijuí, até uma estrada um pouco melhor, por onde passava o ônibus. Se desse pra eu vim de bicicleta… de Lambreta pegava. Senão, eles levavam (a lambreta) de volta e eu pegava o ônibus. Então era isso. Nós nos víamos muito pouco; talvez isso tivesse feito resistir…


Milton — Como é que foi tão rápido? Em 1975, o senhor já era presidente do sindicato. Como é que foi esse período?
Olívio –
Aí, então, em 1970, eu chego com essas experiências já. Acho que já estou me demorando…


Milton — Já deu um contexto.
Olívio –
…me demorando demais nesses relatos.


“Em Porto Alegre, na agência mais periférica da rede do Banco”


Antônio Oliveira — Em Porto Alegre, foste trabalhar em uma agência central logo?
Olívio — Eu fui transferido nessas condições e me colocaram na agência mais periférica da rede do Banco aqui em Porto Alegre. E, naquela época, a mais periférica era a agência ali na esquina da Francisco Trein com a Assis Brasil. Na frente tinha a Varig funcionando.


Milton — O Sindicato dos Metalúrgicos.
Olívio –
Isso. E perto do Hospital Cristo Redentor, e tinha aquelas carrocerias Eliziário que depois o Martins comprou e agora é Marcopolo (A empresa Carrocerias Eliziário foi vendida por seu proprietário, Eliziário Goulart, em 1969, para os irmãos Dorval e Paulo Nicola, do Grupo Nicola que, em 1971, passou a se chamar Marcopolo S/A). Então eu vim. Primeiro tinha que vir solito. Digo: “Judite, tem que ser assim, porque tenho que arrumar onde é que nós vamos morar”. Tinha que chegar lá e alugar, ver onde é que eu vou trabalhar e conhecer bem. A Judite era professora do Estado. Ela se formou e passou no concurso e foi lecionar. A Judite também passou um sacrifício, porque, antes de casar comigo, ela foi lecionar sabe onde? Na Coudelaria do Rincão. Coudelaria do Rincão é um enorme latifúndio do Exército lá perto de São Borja, onde eles têm os cavalos; fazem criação de gado e de cavalos. E também serve para manobra do Exército, de exercício. Eu servi o Exército e estive fazendo manobra naquele local. Então a Judite, professora primária, a primeira escola pública que ela foi lecionar foi lá nesse fundão. Ela tinha que morar na escola junto com as outras colegas da Coudelaria do Rincão. Mas isso antes do casamento. Depois de casada, claro, viva, foi transferida para lecionar em São Luiz Gonzaga. Nós morávamos, digamos, no Norte (da cidade), e o colégio que ela lecionava ficava no Sul. Então, pra ir da nossa casa pro Centro, ela tinha que subir. Depois, pra ir de lá pra escola tinha que descer, porque é uma coxilha né. Cidades missioneiras são sempre assim. E nós morávamos na periferia, logo nós morávamos embaixo, tinha que subir, o colégio estava lá na outra periferia…



Coudelaria de Rincão, em Bagé: onde Judite, a mulher de Olívio, começou a lecionar l Foto: Comando Militar do Sul


Poti — Tinha que cruzar.
Olívio –
Tinha que cruzar. Aí quando nós chegamos (em Porto Alegre) … Eu vim e consegui aquele apartamento, até porque aquele pessoal (lá da agência) disse: “olha, colega, eu estou sabendo que tem um colega nosso que mora ali na Cairú, que foi premiado com um apartamento num prédio aqui na Assis Brasil, logo aqui perto, onde tem a agência do Banrisul ali”. Era a agência Passo d’Areia, e (eu) estava falando com o pessoal da agência Cristo Redentor. Então, (fui) naquele prédio lá. Digo: “então posso falar com ele lá?”. (Ele) Disse: “pode, te dou o endereço e tu vai lá e tal”. E aí conversei com ele. Era boa pessoa, familiar, uma família grande, que morava ali na Cairú quase com a Farrapos, e ele realmente tinha sido sorteado. O banco financiou a construção daquele prédio, o Mário Trindade. Foi o primeiro prédio construído com o financiamento do antigo BNH. Então, o construtor pegou financiamento do banco e depois se deu mal: terminou a construção, não por completo ainda, e o Banco sentiu que a coisa não estava bem, que o cara não ia pagar ou vender. E o Banco rapidamente se agilizou: fez outros credores. O Banco se pagou com a área onde ele foi instalar a agência e (tinha) seis apartamentos lá, no conjunto 218. Seis apartamentos ali. O Lazzari, esse meu colega, tinha sido sorteado. O Banco sorteou entre os funcionários mais antigos, mais afamiliados como se diz da pessoa da família. E o Lazzari se inscreveu, preencheu os requisitos e foi um dos sorteados lá. Mas claro que tinha que pagar o financiamento do BNH (Banco Nacional de Habitação, criado em 1964 e extinto em 1986). Então ele estava pagando lá e tinha que pagar o apartamento em que ele morava. Estava pesado pra ele. Então, paguei pra ele a transferência pra mim. Paguei em prestação a transferência. E continuei pagando a prestação pro BNH. Tinha duas prestações pra pagar do apartamento. Não é fácil.


Rachel — Não tinha Minha Casa, Minha Vida.
Olívio —
Não, não tinha Minha Casa, Minha Vida. E a gente se instalou ali e criamos nossos filhos. E a Judite foi lecionar na Vila Santa Rosa. Lá, na Vila Santa Rosa. Ficou lá por três anos lecionando. Bom, aí eu fui colocado ali nessa agência Cristo Redentor, a mais periférica de toda rede. Não tinha ainda a da Wenceslau Escobar que é na Tristeza. Agora o Banco tem até na Serraria. Tem lá em…

Poti — Belém.
Olívio –
Em Belém tem.


Poti — No Lami.
Olívio –
Tem lá naquela vila lá …

Poti — Itapuã.
Olívio —
Lá depois do… quem vai pro Lami, antes, tem um enorme conjunto habitacional…


“Era o tempo em que questão social era caso de polícia”


Poti — Restinga.
Olívio –
É a Restinga. Então hoje tem, é claro, muito mais longe, mas naquela ocasião era a mais longe. E eu me enturmei já, e já tratei de me sindicalizar. Seu Antônio Luiz — eu me lembro bem — era a cara do Khrushchov (Nikita Serguêievitch Khrushchov, secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética de 1953 a 1964. No XX Congresso do PCUS, em 1956, acusou Josef Stalin de crime de genocídio). Chegava no Banco com um sobretudo e percorria as agências em que, ele sabia, estavam chegando bancários transferidos ou admitidos. Ele ia lá com a proposta… Seu Antônio Luiz, quando eu cheguei, já estava com setenta e tantos anos e ia lá com materialzinho sindical e com proposta de filiação e tal. Ele tinha sido dirigente sindical. Tinha sido bancário. Mas antes, ele tinha sido motorneiro de bonde, da antiga Carris. Então ele tinha histórias interessantíssimas, que eu gostava de ouvir, do sindicato, do tempo da ação direta. O pessoal da ação direta, o pessoal anarquista, que era a base do movimento sindical, e que estavam mais na área da ação, na área do transporte, particularmente de bonde. E o velho Antônio Luiz contava boas e diversas situações de como se dava a solidariedade entre uns e outros. Coisas incríveis, Ele (era) motorneiro de bonde, e a polícia andava atrás. Eles tinham jogado uns cartuchos de dinamite nos trilhos do bonde, E não era da categoria dele, porque a categoria dele não estava em greve. Mas eles tinham que parar os bondes e a polícia, claro… Era o tempo em que questão social era caso de polícia.



“Saia de lá da agência, pegava um ônibus e vinha direto ao Centro, ao sindicato” l Foto:Ramiro Furquim/Sul21


Igor — Eram criminosos.
Olívio –
E o Antônio Luiz contava situações horríveis. Esse era o seu Antônio Luiz. Se recolhessem depoimentos, (daria) a biografia dessa figura.


Milton — O senhor ficou amigo do Khrushchov?
Olívio –
Eu fiquei. Ele ficou muito meu chapa. Ele era um cara que percorria os bancos e, claro, que ele ganhava um dinheirinho por conta de…


Antônio Oliveira — Fazia a cobrança…
Olívio –
Isso. Fazia a cobrança e tal. Foi através do seu Antônio Luiz, um bancário aposentado, com mais de setenta anos (que me sindicalizei). Eu acho que ele tinha quase oitenta, quando eu cheguei em Porto Alegre. Eu acho que ele morreu com quase cem anos. E era a cara do Khrushchov. Aí então me sindicalizei e vinha no sindicato. Saia de lá da agência, pegava um ônibus e vinha direto ao Centro; passava por dentro do Mercado (Público), estava quase caindo o Mercado, e subia e ia lá na…


Antônio Oliveira — Rua da Praia, né?
Olívio –
Era no edifício Cacique ali, é Rua da Praia.


Antônio Oliveira — Quase esquina com a Caldas Junior.
Olívio –
Era ali no Hipólito…

Rachel — Hipólito José da Costa (Museu de Comunicação).
Olívio –
É isso, bem do lado do Museu ali. Edifício Cacique, 11º andar, ali era a sede do sindicato na época. Depois, nós adquirimos uma sede ali na Galeria Malcon e depois essa sede na General Câmara. Eu conheci o sindicato, a primeira sede do sindicato, a mais antiga, era no edifício Bier Ulmann, ali na rua Uruguai com a Siqueira Campos. Ali naquele prédio foi a primeira sede do sindicato. Bom, aí eu não deixava de vir no sindicato. O pessoal da minha agência dizia: “Olívio, tu é um cara que traz coisinhas do sindicato. Não sei se tu é comunista. Esses comunistas são um perigo. Tu não tem medo de ser preso?” (Eu respondia:) “Não, não”.


“Sou um comunista mais de coração, de sentimento”


Igor — E o senhor era comunista naquela época?
Olívio –
Não.


Igor — E como foi o processo de o senhor virar um comunista?
Olívio –
Olha, eu sou um comunista mais de coração, de sentimento, na ideia do comunismo como uma partilha não só de bens materiais, mas da convivência, fruição dos bens da vida, de forma não personalista, pessoal. Esse é o meu sentimento. Sou um comunista de sentimento. Mas nunca fui filiado organicamente. Teve — talvez seja bom também (dizer) nas rememorações — uma ocasião em que um tio meu — é vivo ainda o tio Pedro Beis (faleceu há poucos dias, depois da entrevista, aos 94 anos), irmão da minha mãe, irmão mais velho da minha mãe. Deve estar com noventa e poucos anos. Eu era guri, em São Luiz Gonzaga. Nós morávamos nessa periferia da cidade. Morávamos desse lado da rua e o tio Pedro Beis morava do outro lado, nas casinhas humildes. Então, o tio Pedro Beis era gaioteiro. Gaioteiro (é aquele) que tem uma carroça de duas rodas, daquelas puxadas por um cavalo. E ele prestava serviço pra uma loja, que era a Casa Verde, lá no Centro, entregando os ranchos que as pessoas compravam lá. Ele ia entregar naquela gaiota. Colocava ali e levava na casa das pessoas. Era empregado daquela loja.



“A favor do comunismo como uma partilha não só de bens materiais, mas da convivência, fruição dos bens da vida” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Milton — Gaioteiro?
Olívio —
Gaioteiro. Claro, ele tinha aquele cavalo dele, que ele tinha que dar boia, tinha que dar água. Então, nós andamos muito naquele cavalo. Meus primos e nós nos encarregávamos de montar no cavalo e ir no banhado ali embaixo — nos fundos da casa da gente tinha um banhado — pra dar água pro cavalo do tio Pedro. E também trazer pasto, né. Então, uma parte da infância da gente foi isso. Mas lá um dia, o tio Pedro Beis não vem pra casa e a tia Dolzira ficou preocupada. Falou pra minha mãe: “não sei o que está acontecendo com ele”. Até que veio o delegado, o inspetor, na casa e disse que o tio Pedro Beis estava preso. “Preso? O que ele fez?” Foi preso lá na Praça da Matriz colando cartazes. Isso em 1954, antes do suicídio do Getúlio. Depois é que a história se esclareceu. O tio Pedro Beis, que era o Pedro Goela, que minha mãe chamava, minha mãe tinha discussões com ele. Tinha com outros também. Só que os velhos eram do PTB e ele também. Só que ele era do PTB, mas estava na periferia do partido. Era comunista e a gente nem sabia. Mas, tinha uma célula do partidão, que era uma célula mais do pessoal que morava no Centro: advogados, um ou outro classe média ilustrada e tal. E o tio Pedro foi trazido por esse povo. Ele, cumpridor de tarefa. O PC tinha uma divergência com o Getúlio naquela época. Tinha umas críticas duras ao Getúlio e expressava isso em um material que o Pedro foi destacado pra ir colar. (Devia colar) aqueles cartazes nos postes da Voz Alegre. Ali era uma espécie de radiação de notícias. Em cada canto da praça, tinha um poste com alto-falantes. Então lá da rádio ligavam aqueles alto-falantes. Lá de casa, que era 12 quadras da praça, a gente ouvia as notícias. Um troço que vale. As pessoas ficavam perto daquele poste e vinham. Era um ponto de referência. E o Pedro, em uma madrugada, foi colar cartazes no poste. Colou em um, colou em outro. Ocorre que na frente ficava o clube Harmonia, que era um clube mais grã-fino da cidade. As autoridades ficam lá, carteando, e o promotor, na época, saiu de uma carteada dessas e (o tio Pedro) foi pego pelo próprio promotor, colando. O promotor deu voz de prisão pra ele.
(risos)
Olívio –
Bom, mas e daí, como é que a família ia sobreviver e tal? Claro a minha mãe e nós, os pobres tudo ali, nos cotizávamos e tal, pra não deixar faltar comida pra família e ir levar boia pra ele na cadeia. Levei a viandinha de boia pro tio Pedro lá na cadeia da cidade. Na ocasião, me lembro, final de semana, a família ia lá pra visitar o parente na cadeia. E ali tinha uma cela em que estavam presos contrabandistas. Naquela época tinha, também, uns falsificadores de dinheiro. Na frente (da cadeia) tinha um carro — pra época era carro de luxo –, gente bem-vestida pra ir visitar aquelas figuras que estavam ali. E nós naquelas nossas roupinhas pra ir ver o tio Pedro lá. “O tio Pedro vai morrer na cadeia, quem é que vai vim defender?”, minha mãe perguntava: “Mas meu irmão não matou, meu mano não roubou, como é que o homem está preso? Esses aí eu acho que até mataram, esses roubam, esses falsificam, estão aí, vão sair, têm dinheiro, têm advogado. Meu irmão não matou, não roubou e não temos dinheiro pra pagar advogado”. Até que um dia chegou, numa dessas visitas, um advogado famoso na região de Santiago, um criminalista, e disse: “quem são os parentes do seu Pedro?” Minha mãe: “eu sou imã, aquela é a esposa” e tal. E diz ele: “eu vim aqui defender o seu irmão”. E deu o nome e minha mãe disse: “mas o senhor é um advogado de fama. Nós não temos dinheiro pra pagar”. (O advogado disse:) “Mas eu não estou vindo aqui por conta de dinheiro, dona Amélia. O seu irmão está amparado pelo nosso partido, o Partido Comunista.” Ô! A minha mãe…
(risos)


Igor — Deixa preso.
Olívio –
Não, a minha mãe passou a dizer: “O meu irmão não matou, o meu irmão não roubou, e tem gente que se dispõe a defender, então nós estamos tudo comunista”. E aí era o Danton, um advogado famoso de Santiago, criminalista, ficou famoso tribuno e tal. Bueno, ele liberou o tio Pedro, e aí o tio Pedro ia ficar fazendo o quê lá em São Luiz? Comunista…
(risos)
Olívio –
…quem é que ia dar emprego pra ele? O tio Pedro também pegou a família e as trouxinhas. Colocaram tudo num trem e vieram pra Porto Alegre, morar na Dona Teodora, ali no Navegantes. Situação das mais difíceis. Ele passou a trabalhar na TJ, indústria de importação e exportação de papel e coisas assim. TJ não sei das quantas. Acho que nem existe mais. Então, enquanto isso…


Antônio Oliveira — T. Janér.
Olívio —
T. Janér. É a T. Janér. Meu tio veio a ser empregado ali, no almoxarifado, essas coisas assim. Eu conto isso por quê? Porque, quando houve intervenção no nosso sindicato, em 1979, e eu fui preso junto com outros pela Polícia Federal, lá um dia o custodiante dos presos veio dizer, com respeito assim, um carioca, boa gente: “O senhor sabe seu Olívio, tem uma pessoa que diz que é seu parente que veio lhe ver aqui.” “Como é o nome dele?” “Seu Pedro Beis, como o senhor é Dutra..”.



“Meu pai sempre muito quieto. Tinha posições, mas não externava. Minha mãe externava posição” l Foto: Ramiro Furquim/Sul21


Milton — É Bes?
Olívio —
Beis, B-E-I-S. Mas, levaram até meu tio, tio Pedro Beis, que eu não via há muito tempo. Disse: “olha meu sobrinho, eu vim aqui te trazer um cigarro, porque o tempo que eu fui preso tu levou uma vianda de boia pra mim”.
(risos)
Olívio –
Ele era da periferia do Partidão, né. Depois daquilo (a prisão), ele estava mais que crente dessa religião. Me lembro de conversas. Meu pai sempre muito quieto. Tinha posições, mas não externava. Minha mãe externava posição. Minha mãe escutava rádio. E o tio Pedro discutia com ela. Minha mãe defendendo o Getúlio, o trabalhismo e o tio Pedro dizendo: “olha, não se iludam, não se iludam porque esses caras (são) tudo gente do dinheiro, fazendeiro. Nós não temos nem fazenda, nem dinheiro e nem emprego. Eles se ajeitam lá e nós levamos ferro aqui”. (Minha mãe dizia:) “Não, mas não, o Getúlio é isso…”. (E ele:) “Não Amélia, a gente não pode se iludir e tal.” São as conversas que eu me lembro, que tinha naquela periferia de mundo, naquela ocasião da minha infância. Bom, então, vejam que eu estou mais voltando pra trás do que…
(risos)
Olívio –
Então sou um militante da base do sindicato. Isso em 1970. E, ao mesmo tempo, me preparo pra fazer vestibular, porque eu saí daquela luta por aquela escola e aquela escola precisava de professores e eu não tinha formação de professor né. Eu digo: “não, mas essa luta vai continuar, e eu posso ser convocado pra ela. Então, quero estudar, aproveitar que estou aqui”. E fiz vestibular direto pra fazer Língua e Literatura Inglesa por conta dessa pequena experiência.


Poti — O senhor tinha vontade de ser professor?
Olívio –
Era, por conta daquela experiência. Tinha sido professor naquela escolinha que a gente instalou. Não tinha como não ser. Era gratuita a escola. Claro, tinha que funcionar num colégio público. Era gratuita. Não tinha dinheiro pra cobrar, não tinha como cobrar dos alunos. Portanto, não tinha como pagar professor. Então, era mais um trabalho de consciência assim. Hoje elas são pagas. Por isso têm o nome de Escolas da Comunidade. São boas escolas. Algumas. A maioria, eu penso. Tratei, então, de fazer vestibular pra isso, por conta dessa perspectiva e tal. Minha fonte de renda, meu trabalho profissional, era bancário. Então, o meu expediente começava às 12h30 lá nessa agência da Francisco Trein com a Assis Brasil, 12h30 tinha que estar lá, e o curso era aqui na Paulo Gama, perto da Reitoria.


“Demorei mais um ano do que minha turma original pra fazer o curso”


Poti – Na Filosofia.
Olívio –
Instituto de Filosofia, Ciências e Letras ali. Se não fosse ali não podia ter feito. Então, eu pegava um ônibus lá na Assis Brasil e descia ali na Farrapos com a Barros Cassal, perto da Igreja da Pompeia. Então, subia a Barros Cassal e descia lá, atravessava a Oswaldo Aranha e ia na Paulo Gama. Era sempre um dos primeiros, senão o primeiro a chegar na aula, porque a última aula não podia pegar, tinha que sair mais cedo de lá.


Milton — Tinha que sair correndo.
Olívio —
Tinha que sair correndo, porque nem boia podia pegar. Portanto, demorei mais um ano do que minha turma original pra fazer o curso, mas fiz. Isso em setenta. Ao mesmo tempo, atuava no sindicato. De noite né, depois do expediente, ia pro sindicato; tinha reunião. Essa é uma questão também séria: o primeiro contato que eu tive com a base do sindicato, com o pessoal que já tinha alguma referência sobre mim, de uma área meio que da Igreja, esquerda e tal, tinha dois bancários presos. Um era o Valneri. Te lembra do Valneri? O Valneri foi vereador do PDT aqui, mas foi cassado. Mas antes o Valneri era bancário. Então, em 1970, quando cheguei aqui, o Valneri estava preso e era da direção do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre (Valneri Antunes, ex-presidente do Sindicato dos Bancários, foi preso em 1968, e eleito vereador de Porto Alegre, pelo PDT, em 1984, tendo sido cassado. Hoje é nome de rua, escola e praça). Tinha sido preso por ser um agitador bancário. Tinha o outro, que era secretário da Federação dos Bancários, que é… sempre me esqueço o nome dele, mas hoje é um alto executivo do Santander. Então estavam esses dois presos. Incomunicáveis. Aí aquele pequeno grupo diz: “olha, esses dois estão presos pela ditadura e não se sabe o que está acontecendo com eles. E isso precisa ser denunciado e nós temos que construir essa coisa toda”. Foram torturados. E aí estavam presos e nós dissemos: “pôxa, e o sindicato? O sindicato não tem feito nada”. Então, nós já tínhamos uma indisposição com o sindicato. O presidente era o Luiz Carlos Mazuhy Cunha, uma boa pessoa, um cara do Banco do Brasil, e acho que (era da) periferia do Partidão. Mas, eu não conhecia. Não conhecia nem o sindicato, nem a direção. Estava tomando pé naquela situação e entrando de corpo inteiro pra organizar uma denúncia sobre aquelas duas prisões. Fizemos muitas reuniões. E eu sem conhecer a cidade, sem conhecer o ônibus que tinha que pegar pra ir aqui, pra ir ali, pra fazer uma reuniãozinha semiclandestina, pra organizar um texto que denunciasse aquelas duas prisões. E, depois de produzir aqueles textos, como imprimir? Como fazer chegar na categoria? Então foi um tempo que… Mas, foi possível.



“Passamos uma semana datilografando os endereços das agências bancárias” l Foto:Ramiro Furquim/Sul21


Nós pegamos a lista telefônica e pegamos todos os endereços das agências de banco aqui de Porto Alegre. Depois pegamos envelopes em branco, e uma máquina velha. Passamos uma semana datilografando com os endereços das agências bancárias, em duas, três máquinas diferentes. Depois, nós distribuímos em diferentes pontos da cidade para entregar no Correio. Fomos nas agências de periferia e tal. Colocamos para cada agência, dependendo do tamanho que nós calculávamos para aquela agência, um número maior de folhas. E eu trabalhando na agência. Estava ainda lá na Cristo Redentor. Era o seu Calegaro o gerente. Ele me respeitava muito, porque eu sempre fui de cumprir horário, fazer bem as tarefas. O meu trabalho sempre foi elogiado, né. O gerente me chamava para ser o redator de correspondência e tal. E, claro, eu recebia a correspondência e distribuía. Aí chega aquele envelope (e eu disse:) “seu Calegaro, também tem esse envelope; chegou aqui, junto com outro”. Entreguei pra ele e fiquei né (esperando); aí o seu Calegaro diz: “olha, essa correspondência aqui está meia… Mas, tudo tem cara do sindicato entrega aí pras pessoas que acho que elas têm que ler”. Aí, eu entreguei.
(risos)
Olívio —
Aí eu desci. Passei em outro banco na Assis Brasil. Tinha três ou quatro agências (no caminho) antes de chegar em casa, e tive ocasião de ver se tinham recebido ou não. Em algumas, o gerente simplesmente tinha horror. Botava no lixo como se estivesse pegando fogo nas mãos dele.



Olívio – Eu continuei trabalhando no Banco e estudando. Sei que chega um tempo lá (em que) os três diretores antes de mim efetivos, ou quatro, fizeram acordo com o Banco. Foram fazendo. Naquela época os caras queriam se resguardar do sindicato né, para depois não serem demitidos dos bancos. Estavam querendo sair por uma outra, então fizeram acordo com o Banco. Aí o Mazuhy (presidente do Sindicato) disse: “olha, tu é o quarto suplente, e não tem mais (ninguém) aqui. Tu vai ter que assumir e tal”. Aí que eu assumi naquela área de comunicação do Sindicato. A partir dali, nós trabalhamos “O Bancário” (jornal do Sindicato), feito lá pela cooperativa (Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre), e começamos a estabelecer uma relação e a fazer as circulares do Sindicato ser mais atrativas para ser lidas, debatidas, (fazendo) deseínho e tal. Já tinha também a experiência que comecei a ter com o Lula (Luiz Inácio Lula da Silva) — a gente se conheceu em 1975. Também acho que no país já estava começando a ter algum respiro por conta de uma série de coisas. Depois na próxima eleição, em seguida, um ano depois de isso aí, encabecei uma chapa. Encabeçamos uma chapa e apareceu uma chapa… uma chapa…



Experiência de Lula como líder sindical ajudou Olívio l Foto: xavierpt.blogspot.com


Antônio Oliveira — Uma chapa de oposição.
Olívio –
Não, não de oposição.


Antônio Oliveira — Não?
Olívio —
Não, eu não fui oposição ao Mazuhy. Mas tinha uma área daquela direção que não queria nada com o pastel. Muito escagaçada, muito com medo das coisas. E tinha um setor da base que era de centro-direita, de direita escondida, que veio pra eleição e foi derrotada. Aí as coisas vão se desdobrando, se desabrochando o sindicalismo de base que nós sempre propugnamos e começamos a colocar em prática. Aí que eu vim ter a resposta para aquela pergunta que ficou me martelando na cabeça: “por que lá, em 1962, naquela greve, nós fizemos uma reunião pra participar da greve, decidir, e dois dias depois ela terminou sem nenhuma consulta, sem uma nova reunião?” Eu perguntava pra um pessoal mais antigo, pra um colega meu, por sinal já falecido, bela pessoa, o apelido dele era Pelegão.


Igor Natusch — Por que será?
Olívio –
Porque ele era…


Rachel — Ah ele que te deu a resposta né? Está certo.
Olívio –
É, foi o Pelegão quem me deu a resposta. O apelido dele era Pelegão. O Pelegão vinha para a zona do sindicato, mas ele também era bancário, profissional. Bancário de terno e gravata. Fazia questão disso. Não sei qual era a ligação ideológica e partidária (dele), mas eu acho que ele também era de uma área de periferia do Partidão. O Pelegão vinha pras assembleias e o pessoal, lá na agência dele, da mesa ali do lado, no outro dia, perguntava pra ele: “e aí, o que aconteceu na assembleia? Qual foi a decisão?” E ele ficava (dizendo:) “pô! Por que vocês não foram? Não faltou convite. Tem que ir. Vocês são tudo uns pelegos”. O pessoal carinhosamente começou a chamar ele de Pelegão.
(risos)
Olívio –
E ficou com esse apelido carinhoso de Pelegão. Ele era querido do pessoal.


“Se alguém puxasse a nossa gravata, de tão mal que nós estávamos, era capaz de dar descarga”


Rachel — O senhor não tinha apelido?
Olívio —
Não.


Rachel – Não?
(risos)
Olívio –
Não, não tinha não. Esse pessoal que eu estou falando era um pessoal mais antigo né, que eu vim conhecer aqui. O Pelegão era essa pessoa. Eu disse: “Pelegão, me diz por que aconteceu aquilo?” E o Pelegão diz: “olha, Olívio, seguinte: nós fizemos uma reunião, e os bancários estavam tão mal, que a gente passava de gravata na Rua da Praia no final de expediente com a canetinha Bic, dando as nossas palavras de ordem, mas eu te confesso: se alguém na beirada da calçada puxasse a nossa gravata, de tão mal que nós estávamos, era capaz de dar descarga. A situação estava tão mal, mas nós tínhamos que andar de gravata. Mas se alguma pessoa puxasse

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

:: AO VIVO :: 13ª Conferência Interesatadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo

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Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

: : 13ª Conferência Interestadual : : Miguel Pereira apresenta as orientações para os debates

A Contraf produziu um caderno com subsídios sobre os quatro eixos principais: emprego e remuneração; saúde e condições de trabalho; igualdade de oportunidades e sistema financeiro nacional.

 

A questão da organização do sistema financeiro nacional todo mundo acha que seja o último tema. Ao contrário, é o principal. Ele trata de como os bancos são organizados e, a partir disso, como se relacionam com a sociedade. Isso determina um perfil dos bancos que demanda um determinado perfil de bancário e um determinado número de bancários para atender a esta demanda. E determina também uma remuneração para este tipo de trabalho. A Contraf vem tentando colocar este tema de volta na pauta central do debate interno do movimento bancário para fazer o assunto ecoar em toda a sociedade. Isso é preciso para que se possa retomar no Congresso Nacional a discussão sobre a importância da regulamentação do Artigo 192 da Constituição, que trata da organização do sistema financeiro. Este artigo foi descaracterizado em 2003 através de uma emenda constitucional proposta por José Serra, que, na época, senador pelo estado de São Paulo. Esta discussão é vital porque, decorrente da falta deste debate, temos o Banco Central legislando, o Congresso tentando regularizar a terceirização da pior maneira possível, e estamos vivenciando um tempo de bancos sem bancários.

 

As recentes resoluções do BaCen alteraram a configuração dos correspondentes bancários para pior. A partir de fevereiro e março deste ano, os eles podem ser criados com a função exclusiva de serem correspondentes. Isso até então era proibido. O que havia era a permissão dos bancos fazerem parcerias com uma rede de lojas, de supermercados, ou seja, redes de comércio, e esta atividade era assessória a esta rede. Hoje, não, o correspondente pode ser criado exclusivamente para ser correspondente. E, pior, os bancos poderão criar seus próprios correspondentes. Estamos vendo o BB criar o MaisBB e as agências complementares, e os bancos privados também poderão ter a sua rede de correspondentes próprios dentro da holding. É muito fácil para os bancos aumentar o lucro: vão eliminando as despesas com o bancário, demitindo, abrindo correspondentes, terceirizando todo o serviço interno das agências. Quando abrirmos os olhos, não teremos mais bancários. As lojinhas, os correspondentes, os puxadinhos estão para todo lado. São verdadeiros bancos, que fazem tudo que uma agência bancária tradicional faz, atuando sem ser banco e sem ter bancários. A remuneração dos trabalhadores dos correspondentes é de comerciário – pouco mais que um salário mínimo –, a jornada de é de 44 horas semanais e eles trabalham aos sábados e domingos. Esse é um tema de fundamental importância para que todo dirigente sindical bancário conheça, debata na categoria, porque, se prosperarem estas duas últimas resoluções do Banco Central – a 3954 e a 3959 – para quê os bancos vão abrir mais agências bancarias daqui por diante e contratar mais bancários com todos os direitos da categoria? Vão substituir todo mundo por comerciário.

 

Esta situação vem justamente quando estávamos recuperando o nível de emprego na categoria. Em 2002/2003 chegamos a ter somente 299 mil bancários, mas hoje já estamos com 482 mil. As contratações vêm subindo – muito em função das contratações nos bancos públicos, não nos privados. Estas resoluções do BACEN poderão jogar tudo por terra, na medida em que tanto os bancos públicos quanto os privados puderem terceirizar e montar correspondentes.

 

Também temos que trazer o debate sobre o trabalho decente. O governo tem uma agenda para cumprir até 2014 – e ano que vem vamos realizar a primeira conferência sobre trabalho decente do Brasil. Esse debate vem através da OIT e o Brasil é signatário, enquanto estado. Como podemos falar de trabalho decente no Brasil se temos a rotatividade nos níveis que temos? A cada trabalhador que é demitido, temos um substituto que entra ganhando 40 % a menos. A questão do emprego, que está no caderno de subsídios, é um dos temas centrais, seja pela questão da rotatividade, seja pela tentativa de substituição do trabalho por terceirizações, de mão de obra ou de serviços. Nenhum outro país do mundo, nem da América Latina, tem esta rotatividade que as empresas brasileiras aplicam. Isso acaba virando mais-valia, aumenta a rentabilidade dos bancos.

 

Além da questão da rotatividade, temos a importância de fazer o enfrentamento do PL 4330, do Sandro Mabel (PL/GO), que foi votado agora em maio na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados. Este projeto é nocivo aos trabalhadores, porque autoriza toda e qualquer terceirização, seja nas atividades fim ou meio, em empresas públicas ou privadas, negando a responsabilidade solidária. É um retrocesso total, vai rasgar as convenções coletivas das categorias, porque se você avança numa convenção de dia, e à noite a empresa terceiriza este segmento, tudo vai por terra, porque a convenção não se aplica àqueles trabalhadores terceiros. E é isso que os bancos querem: legalizar e legitimar a precarização do trabalho que já ocorre hoje.

 

 

Na questão da remuneração, percebemos que é cada vez maior a parcela, o peso da remuneração variável, aquela que é flexível. A conversa de que “se fizer ganha, se não fizer, não ganha”, é o maior engodo. Não é assim que as coisas funcionam. A legislação sobre PLR é muito ruim, permite que os bancos instituam programas próprios sem negociação com os sindicatos. No nosso caso, temos um modelo que distribui um volume considerável dos recursos do banco, mas que acaba não dialogando com o conjunto de lucratividade do sistema. Entendemos que, quando se fala em distribuir entre os maiores e os menores salários, o teto é importante, para não se consumir muito recurso entre quem ganha muito mais. Mas o teto de 15 % de lucro a ser distribuído acaba estabelecendo o limite de lucro de que o trabalhador vai participar – no mínimo 5 % e no máximo 15 % . Esta ainda não é a fórmula adequada.

 

Estamos também valorizando cada vez mais a discussão dos pisos. É preciso recuperar o poder de compra da categoria através dos pisos porque, principalmente nos bancos em que há planos de cargos e salários, essa valorização repercute em cascata nas funções, nas comissões.

 

A questão do aumento real também é fundamental, porque repercute, inclusive, na economia. Quanto maior o poder de compra do trabalhador, mais a economia se aquece, maior a produção, maior o nível de emprego. Ou seja, torna-se um círculo virtuoso e não um círculo viciado como tínhamos antes. Só isso pode permitir não o crescimento, mas o desenvolvimento econômico. O crescimento econômico não nos interessa, porque a renda continua concentrada. Estamos querendo discutir desenvolvimento, onde o trabalhador participa deste acréscimo da renda. E a forma é melhorar os salários, com aumento real.

 

Temos também o debate sobre saúde e condições de trabalho. A categoria bancária é adoecida, deprimida, de tanta cobrança, tanta meta – é a tal produção flexível. Mas o ser humano não foi geneticamente construído para ser tão flexível, ele tem seus limites. A forma como a produção é organizada se traduz em precárias condições de trabalho e está fazendo com que o bancário seja um dos trabalhadores mais adoecidos. Ano passado, em 2010, as estatísticas mostraram pela primeira vez na história um número de demissões a pedido maior que o de dispensas sem justa causa. Isso mostra que a categoria não está agüentando e está pedindo para sair, porque a pressão pelo cumprimento de metas é absurda.

 

Daí decorre outro problema: o assédio moral, que é inerente à organização do trabalho. No ano passado tivemos um avanço quando conseguimos que os bancos admitissem que o trabalho adoece. Tivemos um acordo específico para prevenção dos conflitos do ambiente de trabalho para tratar do assédio moral – de outros conflitos também, mas principalmente do assédio. Agora precisamos fazer um balanço de como isso se deu no primeiro ano para aprimorar este mecanismo.

 

Dentro deste debate de saúde e condições de trabalho, temos a questão da segurança bancária, que é outro tema da maior importância. Temos observado uma média de dois bancários mortos por mês no Brasil e também outros tantos clientes envolvidos em ocorrências de assalto. E os bancos dizem que isso é um problema de segurança pública.  Mas não é. Na própria relação contratual os bancos têm que assegurar a integridade física do trabalhador.

 

Quanto ao tema da igualdade de oportunidades, vemos que o problema se acirra. É positiva a participação das mulheres, mas o que acontece é que elas recebem até 37 % menos que os homens. Se considerarmos que, na rotatividade, os novos bancários entram ganhando 40 % menos que quem foi desligado e, o novo bancário contratado, se for mulher, logo no início da carreira, vai começar a ganhar 37 % menos que os homens, percebemos que as mulheres são super exploradas. Vemos também uma pequena presença de negros e de pessoas com deficiência. O sistema financeiro, que poderia contribuir com esta pauta social, não contribui em nada e só aumenta a discriminação e a segregação. Nos bancos públicos, a mulher também enfrenta outro problema: a maioria dos cargos de chefia é ocupada por homens. Isso é uma questão que se relaciona com a democracia no país, já que democracia pressupõe tratamento igual para todos.

 

A Fenaban faz esta discussão na linha do marketing, de dizer que é um setor mais organizado, dinâmico, que está à frente. Mas os bancos só fazem este debate em razão de denúncias do movimento sindical ao Ministério do Trabalho de que há discriminação no ambiente bancário. Quando foi feito o Termo de Ajuste de Conduta com a Fenaban foi no âmbito da Justiça, não foi porque os bancos resolveram promover internamente a igualdade de oportunidades.

 

A partir deste TAC a própria Fenaban encaminhou a pesquisa Mapa da Diversidade, mas foi opção da entidade patronal não incluir a questão da orientação sexual. Foi feito um mapeamento interno para verificar a remuneração e a presença de mulheres, negros, pessoas com deficiência, mas a questão da orientação sexual nem foi incluída. Fizemos a crítica naquele momento e a Fenaban disse que o assunto era muito polêmico e que não iria tratar dele. Nós do movimento sindical discordamos, porque, já que estamos falando em igualdade de oportunidades, que ela seja oferecida independente da cor/raça, gênero, deficiência e também da orientação sexual, e o movimento sindical sabe que os LGBTs também são discriminados no ambiente de trabalho.

 

Continuamos insistindo para que haja um novo censo para atualizar os dados. E, mais que isso, a Fenaban realiza a pesquisa, mas não promove nenhuma ação afirmativa. Temos a mesa de igualdade de oportunidades, que tem negociações permanentes, mas é uma das mesas que menos avança. Apesar de todos os avanços que o debate vem apresentando – e já temos questões bastante amadurecidas para apresentar na mesa de negociação – os bancos fogem deste debate. Eles ainda usam muito esta temática como marketing, mas vemos muito poucas ações concretas para resolver o problema.

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

13ª Conferência Interestadual será transmitida ao vivo

Este ano, pela prieira vez, faremos a transmissão ao vivo, pela Internet, da
Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo.


Quem não puder ir pessoalmente poderá acompanhar pelo site da Federação, pelo
Twitter e pelo Facebook.


Veja abaixo o convite para assistir à transmissão:

Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES

Bancários acampam na Rio Branco contra demissões

Os funcionários do Itaú Unibanco ampliaram as mobilizações, diante da negativa do banco em suspender o processo de demissões em massa, iniciado em 2010 e intensificado este ano. Na quinta-feira (7) foi armado um acampamento em frente ao prédio do Itaú da Avenida Rio Branco, 123 e, promovida uma caravana que passou pelas principais agências da avenida e ruas adjacentes. O protesto teve como intenção pressionar os representantes do Itaú, que negociavam no mesmo dia com a Comissão de Organização dos Empregados (COE), em São Paulo, a suspensão das dispensas.


Durante a manifestação diretores do Sindicato distribuíram panfletos e jornais aos bancários e clientes denunciando a covardia das demissões, principalmente se tratando de um banco que vem batendo recordes de lucro a cada ano. Em 2010 a empresa faturou R$ 13,3 bilhões, o melhor resultado da história do sistema financeiro nacional. No primeiro trimestre deste ano o lucro líquido foi de R$ 3, 5 bilhões, o maior já alcançado por um banco neste período.


As demissões no município do Rio de Janeiro continuam, mesmo depois que o movimento sindical começou a pressionar o banco. Na última segunda-feira, dia 11, houve seis demissões nos departamentos lotados no prédio 123 da Av. Rio Branco. Na manhã da terça-feira, dia 12, enquanto os dirigentes sindicais montavam acampamento em frente à agência 123 no Centro, acontecia em São Cristóvão, no prédio da Cancela, uma reunião com os trabalhadores do teleatendimento do segmento Personalité. “Os funcionários foram informados de que o serviço será transferido para São Paulo. O banco informou que os empregados do setor seriam realocados em agências, mas não temos nenhuma garantia disso. São 70 funcionários — e suas famílias — que passaram a viver, a partir da reunião, uma situação de incerteza”, informa Cida Cruz, representante do Rio de Janeiro na COE do Itaú/Unibanco.


Greve


Os documentos denunciavam, também, a falta de respeito do Itaú Unibanco com os clientes, já que sabe que as demissões de milhares de bancários farão cair a qualidade do atendimento. Segundo a diretora do Sindicato Adriana Nalesso, caso não seja interrompido o processo de demissões, os bancários vão intensificar ainda mais as mobilizações, podendo entrar em greve. “Se a intransigência continuar, o Sindicato convocará uma grande assembleia,  e não está afastada a possibilidade de decretação de  greve”, afirmou.


A queda na qualidade no atendimento e a sobrecarga de trabalho geradas pelas demissões em massa ficam claras quando se constatam vários casos de desvio de função. O caso mais grave é o dos gerentes operacionais colocados para trabalhar como caixas, o que desmente a argumentação do Itaú Unibanco de que está contratando mais do que demitindo.

Fonte: Seeb-Rio, com FEEB-RJ/ES

Contraf-CUT cobra soluções rápidas para temas de Igualdade de Oportunidades

A Contraf-CUT, as federações e os sindicatos se reuniram na sexta, dia 8, com a Fenaban, para a primeira rodada da mesa temática de Igualdade de Oportunidades em 2011. A última reunião havia acontecido há exatamente um ano. Entre os itens tratados no intenso debate, que durou cerca de quatro horas, os dirigentes sindicais defenderam a criação de um Plano de Cargos e Salários (PCS) para todos os bancários, que seja transparente e que promova a igualdade de oportunidades. Uma próxima rodada de negociação foi agendada para agosto, com data ainda indefinida.


O presidente da Confederação, Carlos Cordeiro, participou do encontro e criticou a morosidade dos representantes dos bancos para a retomada do processo negocial. “Levar um ano para retomar as discussões sobre o tema é prejudicial para os trabalhadores. Precisamos promover os debates antes que seja iniciada a mesa geral de negociações da categoria. As questões de igualdade devem ser encaminhadas e solucionadas neste momento”, defende Cordeiro.


Os bancários avaliam que a melhor forma de se promover a igualdade de oportunidades entre todos é a implantação de um PCS transparente, com critérios democráticos e objetivos, que diminuam a influência das escolhas pessoais dos gestores na ascensão profissional de bancários e bancárias.


O tema também foi tratado em seminário realizado recentemente pela Febraban, em São Paulo. “Os próprios consultores do banco afirmaram a necessidade de criar um plano, ainda inexistente, que seja transparente, que envolva a todos e permita o acesso dos bancários ao desenvolvimento da carreira, construído por uma via democrática”, destaca Cordeiro.


Além disso, os dirigentes discutiram a criação de uma campanha de sensibilização de gestores para a concessão da licença-maternidade de 6 meses e a garantia de retorno das bancárias sem a perda das comissões.


Outros itens debatidos pelos dirigentes foram a realização da capacitação de PCDs e de gestores para a promoção da inclusão, a participação do movimento sindical nas grades dos cursos de capacitação de líderes nos bancos, a inclusão da questão relativa a orientação sexual no próximo Censo da Diversidade e a concessão de tíquete-alimentação para a bancária em licença-maternidade.


Os sindicalistas ainda debateram a ampliação dos canais de divulgação das vagas, inclusive através dos sindicatos. “Embora a Febraban tenha feito o lançamento do Portal de Oportunidade, o que ocorreu na prática foi a efetivação de um banco de currículos, o que é insuficiente”, afirma Cordeiro. “É preciso disponibilizar as vagas pelo site, democratizá-las para que todos os trabalhadores tenham o direito de tomar conhecimento sobre as oportunidades existentes na empresa”, conclui Carlos Cordeiro.


Os bancários cobraram dos bancos a realização de reuniões de monitoramento trimestrais para acompanhamento das ações da Fenaban para a promoção da igualdade de oportunidades e análise dos indicadores para avaliar qual o real impacto dessas ações na vida dos trabalhadores do setor. Os bancos concordaram em realizar uma nova reunião em agosto para apresentar os dados do Programa da Diversidade e o balanço das ações que desempenharam no período, comparando os números com os apurados pelo Mapa da Diversidade. Foi definida também a pauta da reunião:



  1. Apresentação dos dados sobre o Programa da Promoção da Diversidade para avaliar os impactos dessas ações e discussão sobre o II Censo da Diversidade;

  2. Campanha conjunta de sensibilização para a licença-maternidade;

  3. Módulo de sensibilização da alta direção dos bancos com participação do movimento sindical: apresentação da grade do curso e discussão sobre o conteúdo e a participação de dirigentes sindicais;

  4. Portal da Diversidade: apresentação do projeto e discussão sobre ampliação de vagas;

  5. Capacitação de pessoas com deficiência e de gestores para a inclusão.


Para Iraciny da Veiga, representante da Federação na mesa de Igualdade de Oportunidades, o encontro foi produtivo. “Apesar de termos levado um ano para retomar as discussões, desta vez saímos da reunião com previsão de nos reunirmos novamente em breve e até a pauta já foi pré-definda. Isto é positivo, porque aponta para uma retomada efetiva da rotina de negociações”, avalia a dirigente.


Também estiveram presentes na negociação Neiva Ribeiro (Fetec/SP), Sandra Trajano (Fetec/NE), Magna Pinhal (Fetraf/MG), Jair Sabudio (Fetec/PR) e Wadson Boaventura (Fetec/CN).


Fonte: Contraf-CUT com Feeb RJ/ES

Fonte: Contraf/CUT, com FEEB-RJ/ES

Bancários do BB querem melhorias nos planos de cargos e fim do assédio moral

O 22º Congresso Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (BB) aprovou neste domingo (10) a pauta específica de reivindicações para Campanha Nacional dos Bancários 2011, que inclui melhorias no Plano de Cargos Comissionados e no Plano de Cargos e Remuneração, fim de voto minerva na Previ, fim imediato das terceirizações e dos correspondentes bancários, intensificação do combate ao assédio moral e metas abusivas, combate ao descomissionamento, fim do fator previdenciário e reforçar o caráter público do BB para ampliar o crédito produtivo sem discriminar os clientes de baixa renda.


“Tivemos um debate de alto nível e intenso. Foram dois dias com discussões que culminaram em aprovações de resoluções importantes que devem fazer parte da mesa de negociações com o BB. Já foi dada a largada para a Campanha Nacional de 2011. Todas as forças políticas estiveram presentes e defenderam as suas propostas e todas estão dispostas a fazer a mobilização em nível nacional”, afirma o coordenador de Comissão de Empresa dos Funcionários do BB, Eduardo Araújo.


O representante titular da Federação na Comissão de Empresa, Sérgio Farias, ressalta que o assédio moral está atingindo níveis alarmantes dentro do banco. “Já tivemos até funcionário que enfartou e veio a falecer em razão de assédio. Foi numa agência do centro do Rio de Janeiro, em agosto do ano passado. Ele sofreu intenso assédio moral para bater as metas e chegou a ser descomissionado como forma de punição. Num ambiente destes, não há saúde que resista. E esta situação é inaceitável, o banco não pode continuar sendo essa máquina de moer gente que tem sido nos últimos anos. O BB é público, tem uma função social e não tem que atuar como se fosse um banco de mercado qualquer”, defende o dirigente.


Outras reivindicações aprovadas pelo 22º Congresso, relativas à previdência, foram a redução da Parcela Previ do Plano 1 e redução da PP no benefício de risco do Previ Futuro, volta da consulta ao corpo social, resgate da contribuição patronal do Previ Futuro, aumento do teto de benefícios para 100 % da remuneração da ativa e aumento do valor do benefício mínimo.


Os delegados também decidiram denunciar o BB à OIT por maus tratos aos funcionários e discriminação aos bancários incorporados, reivindicar a suspensão do projeto BB 2.0 e do modelo de agências complementares.


A Federação enviou 33 delegados, obedecendo ao critério de proporcionalidade definido pela organização nacional dos bancários. Estes representantes tiveram a função de levar as propostas e reivindicações da base, mas a tarefa de mobilizar os bancários é de todos os sindicalistas. “Temos muitos problemas a resolver dentro do banco e só a pressão dos trabalhadores pode arrancar avanços. É preciso que todos os dirigentes sindicais do BB intensifiquem o trabalho junto aos bancários da base para que possamos construir uma campanha salarial forte que possa resultar nas conquistas de que precisamos”, exorta Sérgio Farias.


Veja como foram as discussões em cada um dos grupos de discussão:


Bancários querem denunciar BB à OIT por desmonte da categoria

Congresso dos funcionários do BB quer fim do voto de minerva na Previ

Bancários do BB querem piso do Dieese e combate aos descomissionamentos


Por Renata Bessi

Fonte: Rede de Comunicação dos Bancários, com Feeb RJ/ES