Escolhido como tema da Campanha Nacional dos Bancários 2011, o tema do trabalho decente reúne algumas das principais linhas de reivindicação da categoria. O conceito é definido pela OIT como “aquele que é adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna a quem o exerce”. Baseada na Declaração dos Direitos Fundamentais do Trabalho, a Agenda do Trabalho Decente da OIT é uma reação à política neoliberal de flexibilizar as legislações trabalhistas e vem sendo adotada em muitos países. No Brasil, a Conferencia Nacional será realizada em maio e as estaduais, preparatórias, já foram concluídas.
Com uma organização antiga, forte e nacional, os bancários já abordam vários destes temas, nem sempre conquistando avanços. Veja, a seguir, algumas ponderações sobre estes princípios:
Remuneração adequada
Os bancários conquistaram, pelo segundo ano consecutivo, um aumento do piso com índice maior que o do reajuste salarial. Esta conquista é um caminho para a recuperação do poder de compra dos bancários, que caiu muito nos anos 90 e que vem sendo retomado com os sucessivos aumentos reais obtidos pela categoria.
No caso dos financiários – categoria também integrante do Sistema Financeiro e abrangida pela Contraf-CUT – a política de valorização de pisos também tem merecido destaque e foi garantida em Convenção Coletiva nos dois últimos anos.
Para o bancário Darby Igayara, presidente da CUT-RJ, os aumentos diferenciados do piso salarial são uma boa prática. “A elevação do piso valoriza e recupera o poder de compra dos salários. E, para o país, isso é fundamental, porque, quanto mais gente ganhando salários mais altos, temos mais consumo e mais produção, como o ex-presidente Lula sempre falava. E também temos o aumento do salário mínimo, que tem hoje o patamar mais alto dos últimos 30 anos, o que beneficia muitos trabalhadores. O aumento dos pisos das categorias e do mínimo leva a aumentos também nas categorias organizadas e joga para cima todos os reajustes”, avalia Darby.
Para os trabalhadores do sistema financeiro, falta agora discutir o modelo de PLR, para que a parcela de lucro distribuída aos trabalhadores seja mais justa e mais próxima da importância da mão de obra nos resultados alcançados pelas instituições financeiras.
Liberdade
Este ano, a liberdade sindical foi ameaçada por medidas arbitrárias da Justiça. Em Campos, por duas ocasiões o Procon local obteve liminares na Vara Cível que feriam as garantias constitucionais relativas à greve. Primeiro, foi na greve dos vigilantes, no primeiro semestre. Depois, na greve dos bancários, em setembro-outubro, obrigando as agências a realizar contingência.
A exemplo do que aconteceu em Brasília em 2010, no ano que passou o presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro foi ameaçado de prisão. Uma liminar obtida pelo Bradesco decretou a detenção de Almir Aguiar caso as determinações do documento não fossem cumpridas. Por dois dias, até que a liminar fosse cassada, Almir esteve sujeito ao mesmo tratamento dispensado a um criminoso comum, embora fosse um trabalhador e dirigente sindical exercendo seu direito constitucional de greve.
Por outro lado, o número de interditos proibitórios obtidos pelos bancos na base da Federação foi menor que em anos anteriores. Talvez isso signifique que a Justiça Trabalhista está mais atenta aos direitos de organização e mobilização garantidos aos trabalhadores pela Constituição Federal.
Equidade
Os bancários estão na vanguarda da discussão sobre igualdade de oportunidades, levantando as discussões no dia a dia e em eventos específicos. Foi o caso do 1º Fórum Nacional Sobre Invisibilidade Negra no Sistema Financeiro, realizado em dezembro deste ano. “O fórum foi um marco para o movimento sindical. É fundamental que nós, sindicalistas, passemos a ter um olhar mais crítico sobre o ambiente de trabalho das agências bancárias”, entende Iraciny da Veiga, diretora para Questões da Mulher da Federação.
A organização da categoria já havia realizado uma pesquisa nacional, que resultou na publicação “O rosto dos bancários – Mapa de Gênero e Raça do Setor Bancário Brasileiro”. No documento, fica clara a baixíssima participação de afrodescendentes no sistema financeiro e a diferença de remuneração entre brancos e negros. Mas, desde a publicação do material, em 2001, pouco se fez em direção à igualdade de oportunidades, embora o tema seja recorrente nas campanhas salariais da categoria. “A luta não é só deste segmento da população e sim do todos os brasileiros e brasileiras que buscam um país mais justo e mais igualitário”, defende Iraciny.
Na base da Federação, uma iniciativa pioneira comemorou sua maioridade: o jornal Mulher 24 horas, publicado pelo Sindicato dos Bancários do Espírito Santo, que está completando 18 anos de existência. No boletim, publicado mensalmente, são abordados temas relativos ao dia a dia da mulher bancária, com suas dificuldades no ambiente de trabalho e as demandas da jornada dupla, entre outras questões.
Mas, infelizmente, uma publicação sindical não pode, sozinha, promover as mudanças necessárias. As bancárias com cargos mais elevados nas agências ainda resistem a gozar da licença maternidade ampliada, conquistada na convenção coletiva de 2009. Mesmo com o avanço da ampliação da licença, permanece a relação desigual entre homens e mulheres no mercado de trabalho bancário, mantendo as trabalhadoras presas ao velho dilema de escolher entre crescer profissionalmente ou constituir família.
Isso sem falar na questão da diversidade sexual, que os bancos sequer aceitam discutir. Na base da Federação, o caso da funcionária do Itaú Márcia Líbano, que foi demitida após seu gestor descobrir que é lésbica, pode ser exemplar para toda a comunidade LGBT. O Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro, ao qual a trabalhadora é filiada, já fez muita pressão por sua reintegração, mas precisou apelar para a Justiça do Trabalho. A demissão ocorreu em abril de 2010 e a segunda audiência está marcada para 10 de maio, mais de dois anos depois. Durante todo este tempo, a bancária continua sem emprego.
Segurança
A violência parece não assustar os banqueiros, que continuam se recusando a aprimorar segurança bancária. Os bancários e vigilantes, através de suas confederações nacionais – ContrafCUT e CNTV – estão lutando para que a Febraban aceite ampliar os dispositivos e medidas para reduzir o risco de assaltos e sequestros, mas a briga é feia. Tanto é que, só depois de muita pressão, os banqueiros aceitaram incluir na Convenção Coletiva que a periodicidade da mesa de Segurança Bancária fosse de três meses, a exemplo das outras mesas temáticas, e não semestral, como queria a federação patronal.
A deficiência dos dispositivos adotados pelos bancos tem impacto direto sobre as vidas não só dos bancários, mas também dos clientes. Os assaltos a agências, em pleno horário de funcionamento, voltaram a acontecer em todo o estado do Rio de Janeiro, expondo não só bancários, mas também a população ao risco. E as saidinhas continuam acontecendo, provando que a lei que proíbe o uso de celulares em bancos não é eficiente – no Rio de Janeiro, a lei entrou em vigor no primeiro semestre de 2011. “Esta é uma lei inócua. O que precisa ser feito é garantir a privacidade do cliente na hora do atendimento e reduzir o tempo de permanência das pessoas nas agências”, defende Pedro Batista, representante da Federação na Comissão de Segurança Bancária da Contraf-CUT e CNTV. O dirigente destaca que a triagem que é feita nas filas, com um bancário percorrendo a agência e perguntando qual operação cada cliente ou usuário precisa realizar, expõe ainda mais a população.
A participação dos trabalhadores nas discussões sobre segurança privada – que inclui a segurança bancária – tem trazido frutos, mas ainda tímidos. “Os bancos se limitam a cumprir a lei 7.102, que é de 1983 e está totalmente defasada. Os movimentos sindicais dos bancários e dos vigilantes estão trabalhando juntos para interferir na construção do Estatuto da Segurança Privada, que vai remodelar a legislação. Mas os patrões continuam se opondo às sugestões”, relata Pedro Batista. O sindicalista participou de reuniões entre a Comissão de Segurança da Contraf-CUT e CNTV e representantes do Ministério da Justiça para discutir o texto do novo Estatuto da Segurança Privada. “A proposta que foi apresentada aos trabalhadores era muito boa para prevenir prejuízos materiais para os empresários. A proposta que apresentamos prioriza a defesa da vida, que é o mais importante”, relata o dirigente.
Dignidade
A dignidade do trabalhador está ligada diretamente ao ambiente no local de trabalho. No caso dos bancários, o ar-condicionado ou as instalações modernas – em algumas agências – não garantem um ambiente adequado. O assédio moral imposto pelos gestores em razão da cobrança de metas tem levado os bancários ao adoecimento e os afastamentos por transtorno mental já rivalizam com os provocados por problemas osteomusculares – as LER/DORT.
Para buscar reduzir a ocorrência de assédio moral nos bancos, o movimento sindical bancário conseguiu arrancar da Febraban a assinatura do Acordo de Prevenção de Conflitos no Local de Trabalho. O documento foi assinado por representantes de sete bancos e dos sindicatos filiados à Federação no dia 23 de março.
Com nove meses de vigência, as mudanças trazidas pelo acordo são tímidas. “Este ano tivemos alguns avanços em relação ao acordo sobre o assédio moral, mas ainda há muitos pontos a serem acertados. Tivemos este ano um grande número de denúncias e entendemos que algumas medidas não atendem às necessidades dos trabalhadores. Por exemplo, é comum que gerentes ou administradores apontados como assediadores sejam transferidos, o que só muda o problema de lugar”, avalia Nilton Damião Esperança, vice-presidente da Federação.
A professora Teresinha Martins, doutora em Psicologia Social que vem se debruçando sobre o tema do assédio moral, também avalia que o acordo deixa a desejar. “O texto não fala sobre na diminuição de metas e de práticas que ocorrem dentro dos bancos e que contribuem para a ocorrência do assédio moral. No texto do acordo o problema está ali como se os bancários fossem responsáveis pelo assédio, porque não têm noção de ética. Isso é um absurdo. É um problema de gestão de pessoas”, defende a pesquisadora. Mas Teresinha entende que, apesar dos problemas, a assinatura do documento foi um passo importante do movimento sindical na luta contra o assédio. “Mesmo sendo insuficiente e vago, esse acordo é necessário, é um ponto de partida”, avalia a professora.
Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES