A Glória da arte

Paulinho Santos *


 


 


Aconteceu, durante os dias 27 de janeiro a 05 de fevereiro de 2012, um evento artístico inédito para o local e que movimentou a Praça Paris, na Glória, RJ, até então relegada a atividades diurnas, com um contingente de pessoas que nunca tinham tido motivo ou estímulo para frequentar a praça. Famílias, casais de todas as idades, idosos, crianças, turistas do Brasil e de todo o mundo e fotógrafos amadores e profissionais passeando despreocupadamente pela Praça e pelo bairro sem medo ou pressa. Como foi bom ver a arte movendo as pessoas, numa festa alegre e segura.


 


O artista plástico italiano Giancarlo Neri espalhou pelos jardins da praça 9 mil globos de luz chineses brancos, que mudavam de cor, trazendo para o Rio a instalação que já exibiu em Roma, Madri e Dubai. A ideia da obra “Máximo silêncio em Paris” (o nome da versão carioca é uma citação da instalação original, de 2007, apresentada no Circo Massimo de Roma, durante evento chamado Notte Bianca) começou quando a mulher do artista comprou numa loja popular um globo para sua casa. Ela percebeu que o globo mudava de cor quando a luz estava acesa, e esse fato despertou em Giancarlo o desejo de montar uma obra de arte utilizando esses globos.


 


O resultado foi uma instalação singela, com os globos formando um mar de luzes e cores pelos jardins da Praça, atraindo a atenção e a visitação de milhares de pessoas, que lotaram a Praça das 19h às 00h durante uma semana. Durou pouco, mas deixará marcas no bairro e na cidade.


 


Pude visualizar a instalação diariamente do alto, da janela do meu apartamento, localizado em frente à Praça, e também a visitei por quatro noites. De cima, a visão era fantástica, com as luzes dos globos contrastando com todas as outras luzes do bairro, em torno da Praça. De perto, era simplesmente emocionante.


 


Foi impressionante constatar o poder da arte. Simples bolas coloridas iluminadas e o mundo ficou mais leve, naquele momento, para todos que visitaram a praça, e que foram tocados pela beleza da instalação. Os sorrisos de encantamento dos visitantes era uma demonstração clara de que a arte, para tocar a alma, não requer sofisticação ou grandes rebuscamentos. Basta a sensibilidade e o talento do artista, que entram em sintonia com o olhar do espectador, fazendo a conexão e a transmissão da emoção que se pretende atingir.


 


Este evento foi, para mim, uma demonstração clara de que o poder público pode, de forma racional e em parceria com entidades privadas, transformar a cidade para melhor, sem onerar o contribuinte e sem agredir visualmente o espaço público com publicidade ostensiva. Temos alguns recentes exemplos de parcerias equivocadas, como as bicicletas de aluguel da orla, que ferem o senso estético e agridem o bom senso em prol de um retorno econômico para a empresa patrocinadora, através da publicidade com a pintura e a exibição de sua logomarca na frente e na lateral das referidas bicicletas. No caso da instalação na Praça, a maioria dos visitantes nem deve ter sabido que havia o patrocínio de uma operadora de telefonia, que viabilizou a montagem.


 


As praças e jardins da cidade precisam ser ocupadas pela população para justificarem a sua existência. E para isso, é preciso que o município e o estado garantam limpeza,


 


manutenção e segurança, dia e noite, de todos os logradouros. A cidade tem que ser, cada vez mais, um espaço de uso coletivo, com o ordenamento e a racionalização do trânsito, com a melhoria da qualidade e a extensão do transporte coletivo, garantindo a plena circulação da população.


 


Quando as condições adequadas se apresentam, a população responde, prestigiando e valorizando as iniciativas positivas. Encerrada a instalação, a frequência cotidiana de pessoas na praça aumentou, o que demonstra que os bons e belos espaços públicos, depois de descobertos, passam a fazer parte da agenda dos cariocas. Ganha a cidade e ganham os moradores dela, pois a circulação e a ocupação desses espaços cria um círculo virtuoso, que só traz benefícios a todos.


 


Caminhando pelas ruas da cidade, principalmente no Centro, vemos a quantidade de espaços públicos que são desperdiçados para uso pela população, com ruas mal cuidadas, mal iluminadas, casario em péssimo estado de conservação, enfim, com um ar de abandono que desestimula a visitação e a circulação das pessoas. Essa situação pode e precisa ser revertida.


 


Iniciativas como essa do Máximo silêncio em Paris devem ser estimuladas pelo poder público, contribuindo para humanizar e transformar a cidade e a população com a magia da arte, justificando o título de Cidade Maravilhosa.


 


Nós, cariocas, agradecemos.


 


 


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* Paulinho Santos é bacharel em Letras e fotógrafo amador

Fonte: Paulinho Santos